quinta-feira, 28 de abril de 2011

Good luck sister!

 Há dois meses disse aos "restos" de uma pessoa que ela seria sempre muito mais que as etiquetas que lhe colavam na testa e que faziam com que lhe cuspissem na cara. Hoje chamou-me, mandou que me chamassem, cobriu-me de beijos e disse-me adeus!... Ainda estou a explodir por achar que há vidas que valem!... Good luck sister!

© Mário Rodrigues - 2011

segunda-feira, 25 de abril de 2011

Abril ainda está por fazer…



Abril….

Vagueando pelo meio dos meus documentários...,dei com os olhos no "Capitães de Abril". Sei bem que não é um documentário, mas na minha prateleira está nesse lugar, dos documentários. Tinha 4 anos no dia 25 de Abril de 1974. Não resisti a dar uma olhadela, pela 225ª vez e mais uma vez, como da 1ª vez que o vi, chorei novamente… E principalmente, chorei por continuar a sentir vontade de chorar quando o vejo. Abril ainda está por fazer! Abril foi e é todos os dias enxovalhado e vergonhosamente tomado por bocas e mãos que nunca o entenderam mas sempre o usaram ou se entenderam, no dia da nascença, o enterraram imediatamente.

Abril ainda está por fazer… Abril ainda está por fazer… Abril ainda está por fazer…

© Mário Rodrigues - 2009

segunda-feira, 28 de março de 2011

Não era cedo. Mas também já não era tarde!

Não era cedo; mas também já não era tarde! A luz era esbatida nas estepes, e frio regelava os pensamentos. 

Onde estariam naquele momento? Que estariam a fazer? E ela? Aquela boca, o corpo, as ancas, os seios, as pernas...Seriam ainda, paisagens da sua exclusiva contemplação? E porque haveriam de o ser?

A saudade misturada com a solidão, formavam uma pasta cinza podre, pegajosa que se ladeava no corpo e nos membros, provocando sucessivas quedas pelo torpor no andar dos pensamentos.

A sua existência doía! Doía-lhe mesmo muito existir! 

Os dias foram se transformando em coisas miseráveis, que nada tinham de desejado. O urso que sacudia toda a casa, casa...; o urso, com as patas, partia pedaços a cada impacto; desejoso, selvagem, brutal...quando ainda havia cheiros...Era a sua única visita... Mas desde que o último pedaço de gordura de foca se extinguiu... Deixou, sim, deixou de aparecer.

O couro das botas cozinhado em neve na chama de querosene, foi o último manjar... 

Lá fora...branco, muito branco! 

Que quente que está o seu ventre... Acabara de lhe beijar os seios, muito suavemente, eles, dormiam já...hoje teria vergonha de fazer amor com ela...está impuro; mas por dentro. Nada fez de condenável, mas sente-se degradado. 

Não era cedo; mas também já não era tarde! Talvez, de manso, ela se aproxime. Talvez, sem dor, o acolha. Talvez sedutora o envolva... 

Lembro-me de a ver chegar, lenta, discreta, poderosa. Lembro-me de a desejar. Lembro-me de lhe não resistir. Lembro-me de o último suspiro expirar...

Não era cedo; mas também já não era tarde!

© Mário Rodrigues - 2009

sábado, 19 de março de 2011

Dia do Pai

Ao meu, disse-lhe que gostava de ser como ele quando for grande.

A mim...

Mil beijos

sexta-feira, 18 de março de 2011

Um dia, um dia tentei!

Um dia, um dia tentei! Mas num prenúncio de vida adiada, a tentativa saiu frustrada!
Sou incompreensível!
Ponto final.
Tenho tempo!
Talvez um dia!
Antes de depositado por sobre a raiz da sequóia sob a forma de carbono devolvido... Ou não!

© Mário Rodrigues - 2011

Havia...

Havia...
Estou de volta ao psiquiátrico!
Tenho medo de uma certa alegria que chego a sentir... Pelo reencontro com a lucidez dos "loucos"!...
Não tenho a certeza se aquela casa me tira ou dá dias de vida... Mas faz-me uma coisa extraordinária que é chorar compulsivamente por dores alheias...

Obrigado Lúcia...

© Mário Rodrigues - 2011

Hoje vi um cão!

Hoje vi um cão!
Os cães são animais amistosos...quando mordem é porque têm razões. 
Gostava de um dia ser um cão. Eles sé mordem quando têm razões. 
Alguns mordem porque não foram bem-criados e porque reflectem o desespero dos donos. Os cães pressentem os medos e os anseios dos homens. Isso reflecte perigo devido à instabilidade emocional de um bicho desequilibrado que é o homem. Eles, os cães, põem-se à defesa! 
Começam por ladrar em tom receoso. Sim. O homem representa um enorme perigo para os cães! Os homens, dificilmente compreenderão os sentimentos de um cão!

Esta manhã vi dois! Estavam debaixo de um telheiro. A dormir debaixo de um telheiro. Cobertos por um cobertor fedorento, nojento e asqueroso!... 
Eram invisíveis!
No entanto, estão atravessados nos meus olhos como ciscos granulados!

© Mário Rodrigues - 2011

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2011

Não, não é nenhuma novidade...

Não, não é nenhuma novidade, infelizmente. Há já muito tempo que clamo e grito até a minha voz se sumir. A promiscuidade entre o poder político, o poder judicial e a banca é vergonhosa, escabrosa, corrupta, injustíssima e atenta aos mais básicos dos direitos humanos do povo. O “putedo” em redor das trocas de poleiros, proporciona a possibilidade do, “hoje eu abro-te esta porta, que está fechada para todos mas como eu tenho as chaves… se amanhã tu me garantires…” É gritante o modo como a banca deste país, verdadeiros agiotas, seres repugnantes, “merdosos” que sem escrúpulos nenhuns, afrontam quem roubam, com lucros vergonhosos, tendo em conta de não passam de carcaças que tiraram das bocas dos nossos filhos, das casas que pagamos 3 vezes, do nosso nome e honestidade que será sempre muito maior que a deles, e que eles protegidos pelos amigos governantes e com a conivência dos compadres judiciais, enxovalham nas lamas publicas de listas que são acima de tudo o retrato da sua própria incompetência e ávida ganância. Se assim não fosse, em vez de se aproveitarem das fragilidades, sem quaisquer escrúpulos, ajudariam a tomar decisões mais acertadas e responsavelmente, dizerem “não”, sempre que fosse sinónimo de responsabilidade. Mas tudo isto se passa sem problemas, porque quem hoje rouba na administração de um banco, amanhã é ministro de qualquer coisa e depois administrador de uma qualquer EP, para colher umas reformas milionárias, roubadas aos contribuintes, com a garantia que logo depois serão acumuladas com a administração de outro banco ou coisa do género. O país não tem a culpa de rigorosamente nada e recuse-me a emigrar. Mas sinto-me permanentemente roubado, espancado, violado… Por um “chico-espertismo” de alta-roda, que somos obrigados, escravizados, a alimentar. Continuarei a gritar, apesar de poder ser chamado de masoquista…


© Mário Rodrigues - 2011

Coiso...

Sem conotações partidárias, sindicais ou quaisquer outras, sem fantoches que se juntam a uma luta pela frente e se lambuzam vergonhosamente nos bastidores, quero, desejo e sem qualquer receio me junto a um brado em uníssono para transmitir que os portugueses em geral e nós os mais jovens não somos parvos. Não somos rascas. Não somos inúteis. Não somos despreocupados nem distraídos. Somos inteligentes, vemos muito bem e há já muito tempo, que somos explorados, roubados e desrespeitados pelos governantes e toda a teia promiscua de interesses especulativos e financeiros que os rodeia, num bolo de vergonhosas dimensões. Está na hora de deixarem de nos afrontar a fome com exibições de lucros milionários às nossas custas. Está na hora de serem honestos e dignos da confiança que lhes foi confiada. Está na hora de deixarem de nos usar a todos como insectos desprezíveis que podem ser esmagados com a ponta de um indicador. Está na hora de dizermos todos que sabemos muito bem o que eles fazem e como fazem, o que usurpam e de que modo, mas que estamos fartos. Que estão a matar a última coisa que deveria morrer no coração de uma mulher e de um homem que é a esperança. 
A revolta de um povo prende-se pelo ele possa ter a perder... Os portugueses em geral e os jovens deste país começam a ter muito pouco a perder.

© Mário Rodrigues - 2011

terça-feira, 22 de fevereiro de 2011

Eu gostava...

Gostava!

Gostava de ser melhor do que sou a fazer o bem, bem
Gostava de poder e conseguir ajudar mais, quem precisa mais
Gostava de saber dizer palavras que acalmassem os inquietos
Gostava de conseguir confortar os desesperados
Gostava de dizer as palavras que contam para os solitarios
Gostava de não dizer a um filho que o pai morreu
Gostava de nunca ser necessário dizer a um pai que o filho nasceu
Gostava que jamais um filho morresse
Gostava de saber o que fazer amanhã
Gostava de saber que o meu filho soubesse que o filho dele tinha futuro
Gostava de ser respeitado
Gostava de não ser roubado
Gostava de não ser ignorado
Gostava de não ser um mero número
Gostava de não ser dispensável
Gostava de não ser um fantoche
Gostava de achar que os outros eram bons
Gostava de acreditar que todos faziam com cuidado
Gostava que o trabalho de todos não fosse delapidado
Gostava de ser possivel gostar de acreditar nisto

E como um amigo meu me disse, "Gostava de conseguir ter esperança..."


© Mário Rodrigues - 2011

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Copulou freneticamente enquanto roía uma cenoura...

Passei pelo jardim zoológico e perguntei baixinho, por vergonha, a um babuíno se estava preocupado com a vinda do FMI a Portugal. O indivíduo ignorou-me, virou-me as costas e correu ávido para junto de uma fêmea com quem copulou freneticamente enquanto roía uma cenoura... Há vidas melhores! São é mais baratas… 

Bem sei que esta é uma reedição! Mas é tão...

© Mário Rodrigues - 2011

quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Portanto, meu amigo, isto não é coragem mas antes medo!

Para melhor se entender este post, deve ser lido antes o "Não sei se algum dia estarei satisfeito", bem como os comentários...


"...Gostava de ter a tua coragem."
...
Olá meu bom amigo,

Leio o que me dizes com cuidado e atenção. A cada passo vou reflectindo em mim. Não me invejes a coragem! Ela não existe! Pelo contrário, o que existe é pânico! Um medo enorme do que os meus pensamentos e a minha "consciência" me façam a mim mesmo! Medo de me ver obrigado a admitir perante mim próprio, que tenho ou tive uma existência inútil e perfeitamente dispensável! Que para nada servi e que nem viver consegui, limitando-me a sobreviver. 
Enquanto te escrevo isto, vai-me assaltando a cabeça o pensamento de que no fundo, nada mais sou que um egoísta pseudo-activo!... Será, quanto muito, uma ferramenta, de cabo partido, para lutar por uma sobrevivência não corpórea. Uma espécie de armistício...

Portanto, meu amigo, isto não é coragem mas antes medo!
Isto não é altruísmo mas antes egoísmo!

Mais corajoso me pareces tu, que sabendo do mesmo que eu, não te submetes aos domínios, enfrentando os medos e dominando os pânicos...

Um abraço


© Mário Rodrigues - 2011

quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

O senhor já cá veio setenta e duas vezes!...

- O senhor já cá veio setenta e duas vezes!...
- Ah!... Sim!... Está bem!...
...
Fui esta manhã, num passeio que me já é lúdico, à Av. do Brasil, ao I.P.S. para me reabastecer. 

Sempre senti a disponibilização do sangue que me percorre as veias e as artérias, e digo disponibilização porque é o que eu faço! Só daria sangue se ele fosse meu, o que não é o caso! Meu é o que eu domino e controlo e por isso poderia dar ou não, no entanto tal não se aplica ao sangue assim como também não se aplica à medula óssea e outras "cenas" que vão andando pelo corpito do rapaz, mas voltando à disponibilização, desde sempre senti que vou lá receber! Receber vida, alegria e bem-estar! Venho de lá a bater com os calcanhares no rabo!... Quando saio tenho o hábito de dizer obrigado, principalmente porque me sinto na realidade agradecido.

Tenho a noção que isso já deve ter dado algum jeito a alguém, mesmo porque, à razão de aproximadamente 830/850 g de cada vez, apercebi-me hoje, que já me tiraram de dentro mais de 70 kg!... O que faria de mim um gajo com uma elegância estúpida!... Não é o caso!... Não obstante, nunca com tal me ocupei mais de dois segundos de pensamento.

Em outras situações, as profissionais, muitas vezes lamentei não haver umas unidades por ali à mão para meter nos canos de um ou de outro que estava a ficar pálido demais!... Mas, estranhamente ou talvez não, tenho comportamentos díspares em ambas as situações.

De qualquer modo, estas setenta e duas vezes, como dizia a minha avó, nem me "aquenta" nem me "arrefenta". Aliás, tensiono, se ele for estando em condições, emagrecer mais uns belos quilos durante mais uns bons anos...

A propósito, vocês também podem ficar mais elegantes se quiserem! 

© Mário Rodrigues - 2011

segunda-feira, 10 de janeiro de 2011

Pregos na tumba do boticário - III

Os meus catorze anos ainda estavam muito frescos. As circunstâncias proporcionaram um trabalho por recomendação... Vá se lá entender as manhas e as manhãs destas vidas!... Estava a decorrer o meu quinto dia de trabalho. Os anteriores, tinham sido compostos de ensinamentos e recomendações por parte das duas gentis senhoras doutoras que me iam incutindo no coiro uma mania de arrumar tudo estéticamente e de que tudo tem o seu lugar e tem de lá estar, que me tem aterrorizado o resto da minha vida.
Dava-se início a umas levíssimas e breves incursões pela zona de atendimento, sempre debaixo de rigoroso e perscrutante observação das ditas.

- Mário, quando alguém lhe pedir alguma coisa, escute com atenção e pergunte em que apresentação é que o cliente pretende o medicamento! Como sabe, eles têm várias apresentações e só assim, você sabe em que armário e ordem ele está!
- Com certeza Sra. doutora!
...
- Bons dias! Eu desejo aspirina!
- Com certeza! Só um momento! Aqui está!
...
- Boas tardes!
- Faz favor?
- Quero uma embalagem de voltaren!
- Quer em comprimidos ou em pomada?
...
- Boas noites!
- O que deseja?
- Quero uma embalagem de bisolvon!
- Quer em comprimidos ou em xarope?

Assim fui lentamente apreendendo os saberes! E já sabia muitos!
Sendo eu o único individuo do sexo masculino presente naquela farmácia, um senhor entra e dirige-se especialmente a mim:

- Boas tardes!
- Boas tardes! O que deseja?
- Quero uma embalagem de durex!
- Quer em comprimidos ou em pomada?
...


© Mário Rodrigues - 2011

domingo, 9 de janeiro de 2011

Pregos na tumba do boticário - II

...
- Bons dias tio Gomes!
- Bons dias Márito! Vais já abrir?
- Está quase. Falta um quarto para as nove... Mas se está com pressa diga, que eu despacho-o já!
- Se calhar é melhor, cosdespois tá aí muita gente...
- Não há problema! Diga lá o que se passa...
- Ando de pederneira! Arranjas-me aí algum bosteiro? Qualquer coisa para bostear!...
- Tem aqui leite de rícino. Tome duas colheres de chá já. Se até a meio da tarde não fizer nada, tome mais duas. Quer levar umas folhas de sene? Para fazer um chá para depois?
- É melhor Márito! É melhor...
...
- Olá tio Gomes! Então isso já anda bom?
- É homem! Aquilo foi de aluvião!...
...

Instruções:
Pederneira - prisão de ventre
Bosteiro - laxante
Bostear - defecar
De aluvião - uma purga

© Mário Rodrigues - 2011

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011

Pregos na tumba do boticário - I

...
- Bons dias meus senhores! Como ides?
- Bom dia senhor Manuel Valas!
- Olá Mário! Estás bom?
- Estou sim senhor, obrigado! Então e o que o senhor deseja?
- Olha rapaz, ando aqui com uma gosma que mete raiva! Arranja-me aí um lambedor! Um de mata bois!...
...
- Aqui tem senhor Manuel Valas. Tome uma colher de sopa quatro vezes por dia; mais ou menos de quatro em quatro horas!
- Ómessa? Atão e o lambedor? Vai pó Tejo?

Instruções:
Lambedor - Xarope
De mata bois - bastante forte

© Mário Rodrigues - 2011

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

As forças interiores e outras trivialidades...

Contava Roberto Rosselini...

Um agricultor num dado dia, levou consigo o seu filho e Borino o cão. Na sequência dos seus lavores, deixa a criança e o cão debaixo de um grande carvalho. Horas depois, quando regressa, encontra a criança degolada com marcas de dentes na garganta. Com o coração destroçado de dor mata o cão. Imediatamente após vê uma serpente enorme e toma consciência do tamanho da injustiça que acaba de cometer. Perturbado coloca respeitosamente o animal numa cova coberta de rocha e colocou-lhe uma inscrição que dizia - “ Aqui Jaz Borino a quem a ferocidade dos homens matou”
...
Vário séculos depois, foi construída ali uma estrada junto do túmulo do animal. Os viajantes, fatigados das suas viagens, descansavam junto carvalho e liam a lápide. Um dia alguém sob o peso da fome, da peste e do cansaço rezou e pediu a intercepção do sepultado vitima dos homens junto das divindades para que a dor lho fosse aliviada.
...
E os milagres aconteceram. Anos depois, os habitantes construíram uma igreja bela Igreja e, lá dentro, um tumulo digno. Eis que, aquando da trasladação dos restos mortais, se deram conta que se tratava de um canídeo...

As realidades e as situações despoletam fenómenos extraordinários dentro das pessoas! Não obstante, elas mesmas, as realidades e as situações, numa conspiração vital, também no contrário são exímias...


© Mário Rodrigues - 2010

sexta-feira, 17 de dezembro de 2010

As namoradas dos meus amigos...

De um modo geral, as minhas manhãs, salvo algumas excepções, são passadas ao volante a "varar" quilómetro enquanto ouço Beethoven ou Skunk Anansie.
Ontem, envolto numa enorme melancolia, necessitava de algo que me agitasse o dia e a mente!
Enviei uma mensagem escrita a dezoito indivíduos com quem tenho uma relação de amizade que dizia o seguinte:

""Manda-me o número de telefone da tua namorada. Acho-a uma mulher muito interessante e quero combinar qualquer coisa com ela. Mário Rodrigues."

As respostas foram eventualmente surpreendentes! Dar-vos-ei a minha análise, antes mesmo das resposta.
Foi-me possível constatar que, ao contrário do que o mundo proclama, a instituição de pseudo-matrimonial não está em decadência! Foi uma constante a confiança que os meus amigos demonstraram nas suas companheiras. O facto de me enviarem prontamente os contactos directos das suas caras metades, na maioria, demonstra uma confiança inabalável nas suas dedicadas e merecedoras companheiras.
Reflicto um pouco...
Será que eles me consideram um eunuco? Que risco algum represento??...
Respostas:
3 Não responderam. Não viram ou não receberam...
1 “...vai pó ca.........”
Dos 14 que me enviaram o número imediatamente na volta da mensagem, ressalto os seguintes:
4 Mandam o número sem mais questões
5 Dizem: “então mas tu já o tens! Fala com ela quando quiseres!
3 Mandaram o número com as instruções do melhor horário para as contactar.
1 Junto do número dizia: “liga agora que ela ainda está na cama...”
1 Junto do número dizia: “...força que o período acabou há três dias e ela está no cio!...”

Como podem calcular, tive um dia bastante divertido assim como os meus amigos, os 14 que entraram e as respectivas respeitosas companheiras que deram origem a conversas dos diabos...

© Mário Rodrigues - 2010

quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

Se hoje me bastasse!...

Hoje não me basta esperar para que o dia passe
Hoje não me basta a escuridão para deixar de ver
Hoje não me basta encolher-me para me refugiar
Hoje não me basta chorar para as lágrimas verter
Hoje não me basta o silêncio para sossegar

Hoje também terei que me afundar; e do fundo de um escuro poço, trazer coisas viscosas emaranhadas nas mãos
Hoje também terei de com dor, escarafunchar na carne, e de um rompante, arrancar o espinho que, cravado há já muito, infectou e está rodeado de matéria pútrida

Mas...

Mas hoje, também deveria, desinfectar a carne escarafunchada e cuidar que sã cicatrize.
Mas hoje, também deveria, transformar coisas viscosas que habitam os fundos dos poços escuros em fortificante que em terra cuidada melhorassem os seus frutos
Mas hoje, também deveria, em sossego, cuidar dos silêncios e conhecer-lhes as origens
Mas hoje, também deveria, verter lágrimas sobre o tempo perdido
Mas hoje, também deveria, nos raios do Sol me refugiar ofuscando os incautos distraídos
Mas hoje, também deveria, sair da escuridão e com olhos limpos começar a ver
Mas hoje, também deveria, ansiar que este, que foi mais uma oportunidade de ser melhor, que este dia não passasse...

No entanto, uma inquietude insatisfeita, faz com que se procure o que virá a ser indesejado e que com desprezo se ignore o que se quis...

© Mário Rodrigues - 2010

quinta-feira, 18 de novembro de 2010

Então mas o que tem acontecido é o que me interessa?

Nasci num dia de primavera, ainda que Dezembro fosse. Nas primaveras está contida a esperança de dias de sol forte. A esperança é uma arma nas mãos da conspiração; impele-nos em epopeias, macera-nos os corações e revolta-nos nos esperados. Epopeia enfrentei no dia em que nasci, hoje tenho outras epo’s, algumas com pouco de peias’s. Alguns dos caminhos, que dados nos são a percorrer, há quem diga que são à escolha! Mal sabem eles que nada se pode neste mundo pensar em escolher! Uns aparentam-se bons, mas a meio as veredas mostram-se. Outros exibem penhascos mas com o andar amaciam... No entanto... No entanto outros há, que desde o primeiro dia os soubemos tinhosos! Caminhos curvos, brisas cortantes de norte, caminhos em que esperamos fés infundadas, caminhos que no seu caminhar a dor não se desvanece, caminhos que nas claridades das subidas, nos cumes revelam a agrura das descidas. Curvos como cordéis enrolados nos bolsos são os sentires da gente daqui. Gente daqui que nada mais queria que ser feliz. Felicidade que todos dizem que procuram. Para? Para exibir em pequenos cartõezinhos que penduramos ao peito – “ Mário Rodrigues, e por baixo, FELIZ” – Sim, tem de ser escrito em letras maiúsculas! Para que o processo de afrontamento se dê com eficácia. A felicidade é como um descapotável, anda-se na rua a demonstrar que temos “posses” para ter um!... E mal se sabe como aquilo funciona!... Afrontamento, não o proveniente da andropausa, sente-se quando o único meio que temos de respirar é por um balão, garantindo que respiramos infinitas vezes o mesmo ar até à embriaguez dos nossos saberes omniscientes, e ainda assim há alguém que pega num alfinete e faz rebentar o dito. Rebentar é um exercício que, penso eu, devia ser praticado com bastante frequência por algumas pessoas. Já rebentei algumas vezes mas nunca as que devia e do modo que devia... Será que é porque não posso escolher? Mas que quero eu escolher? Basta não escolher nada que tudo acontece, na mesma! Acontece o que me não interessa? Ah! Está bem!...

Então mas o que tem acontecido é o que me interessa?
Pessivelmente é poque nada se pode neste mundo pensar em escolher!...
 
© Mário Rodrigues - 2010

quarta-feira, 27 de outubro de 2010

Como atropelar uma ratazana que saiu de uma sarjeta a correr I

O acto de atropelar é na realidade uma acção constrangedora! Tenho de, desde já, afirmar e antes de mais, que o atropelamento terá de ser acidental. De contrário trata-se de um assassinato e os assassinatos são sempre condenáveis pelo que se assim for recusar-me-ei a fazer a síntese de tal acto e isto acaba já aqui!

Não? É acidental?
Está bem! Então irei ser breve!

Terei de considerar se o local do atropelamento é numa cidade, numa vila ou se é numa estrada do campo. No campo não é porque nas estradas do campo não existem sarjetas. A existência de uma sarjeta pressupõe passeios a ladear uma rua, sendo que tal não é muito vulgar nos campos. No entanto nas estradas do campo existem aquedutos, e a ratazana poderia sair de um! Se isso é certo, também é certo de que o acto em causa é o de "Atropelar uma ratazana que saiu de uma sarjeta a correr", e não "Atropelar uma ratazana que saiu de um aqueduto a correr".

Tenho de ter em conta a existência, ainda que pouco vulgar, de uma estrada com passeios e sarjetas no campo. Isto é muito importante porque as ratazanas do campo estão integradas num meio que lhes é natural em que se desenrola a luta pela sobrevivência e como todos os outros seres tem uma missão a cumprir na biodiversidade do habitat... E as ratazanas da cidade... também...

Isto demonstra que não deve haver razões acidentais para, por acidente, atropelar uma ratazana do campo em detrimento de uma da cidade.

Tenho de considerar também se me estou a deslocar a pé, de bicicleta, de mota, de automóvel, de veículo pesado de carga, de veículo pesado de passageiros, de avião ou mesmo de barco!

De barco?

Porquê a admiração em relação ao barco, renegando para segundo plano o automóvel ou mesmo o andar a pé?

Se me estiver a deslocar a pé, terei de garantir algumas condições para que o acto se desenrole acidentalmente. Terei de providenciar, acidentalmente, que eu, tal como o animal em causa, estaremos em marcha e absoluta e inadvertidamente distraídos e absortos da realidade naquele momento. Só assim, conseguir-se-á reunir as condições acidentais para o acto. Terei de observar ainda que não se vá dar um pisamento, nem um abalroamento... Um atropelamento com um pé pode parecer difícil, mas está exclusivamente dependente do empenho e arte de o fazer por acidente.

Não! Nem pensar nisso!... Por momentos, poder-se-ia pensar num enorme pontapé!... Fácil seria se o acto não fosse acidental, mas disso já disse que não falo...

(continua...)

© Mário Rodrigues - 2010

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

O portão forjado

Estava sinceramente agradado por, já à porta de casa, ter regredido um pouco e ter ido buscar o casaco. Era um casaco já bastante usado, cinza de uma malha polar "débil", mas que se tornara largo e confortável para os períodos em que estava a "hibernar" pelas proximidades de casa. Com as mãos nos bolsos, fecho éclair bem corrido até bem perto do pescoço, ia dando uns passos... Involuntariamente, ia atirando com um pé para a frente do outro, de modo que a cinética do tronco, não ultrapassasse perigosamente o eixo do centro de gravidade, o que em duas palavras, diria - caísse estatelado.

Ia a pensar em como seria difícil, não pensar em nada! Procurava uma inexistente possibilidade de conseguir não pensar em nada...

O passeio tinha cerca de dois metros de largura, ladeado do meu lado esquerdo por um muro, relativamente alto, com grandes zonas cobertas de hera, pedaços de reboco centenário prometendo a sua iminente queda, as pedras, as do passeio, pequenos cubos irregulares de calcário branco, estavam polidas e húmidas do intenso orvalho da noite. Este conjunto, muro e passeio, tinha a sua disposição aberta, coberta nas alturas pelas altas folhagens de vários carvalhos, tílias e castanheiros, na direcção do norte. O Sol nascera-me nas costas, garantindo uma húmida sombra na quase totalidade do dia.

Não obstante, um condenado, no dia em que sabe da sua sentença de morte, e possivelmente, depois da revolta, desejaria que a mesma fosse executada de imediato. Esse, deve ter a cabeça a explodir de tantos pensamentos. Uma boa parte da pena, senão mesmo a pior, é a tentativa inglória de querer por ordem hierárquica nos pensamentos e sentimentos nesses momentos. A dor do tempo que ainda falta, que possibilita a manutenção de tal inferno.

A abundância da humidade facultava a proliferação de um verdete, perigosamente escorregadio. Aquele "L" contínuo, composto pela união do muro com o passeio, prolongava-se no horizonte. Lá, bastante ao fundo, um feixe de raios de Sol, desciam a quarenta e cinco graus, antecipando a ainda tardia chegada do meio-dia e do sul, aproveitadores eficazes da interrupção do muro que fazia adivinhar um portão e de um céu com tendências a limpo adornado por cúmulos alvos e fofos.

Parado, a olhar para os cinco ou seis degraus que o levam ao cimo da plataforma da guilhotina ou da forca ou até mesmo do cepo do carrasco... Pensará ele - Já falta pouco!... Penso que o pânico o abraça. O ser humano tem por natureza, o sentimento de morte eminente. É um sistema de alarme extremo com vista a salvar a vida. Será controlável e manipulável? Não me parece, pelo facto de que é completamente involuntário. Não sei se o saco de pano negro na cabeça produzirá efeito! Aliás, acho que produz, mas qual? A cabeça, nessa ocasião estará vazia ou a velocidade e quantidade de sentimentos e pensamentos, provoca o colapso e paragem da consciência? Todos os sentidos estão em funcionamento, ainda, isso é certo! Com a cabeça pendente da espera da lâmina da guilhotina, escuta o destravamento da lâmina de, também quarenta e cinco, mas desta feita quilos e não graus... Curiosa esta coincidência!... Ambos os quadros, este e os raios de Sol, metamorfoseiam a vida e a morte!... Vai ouvindo o consequente silvo da descida da lâmina pelas corrediças. Parecerá ensurdecedor e eterno esse silvo? Não tenho a certeza que exista, nesse momento, alguma luta interior para contrariar a cena!... Possivelmente será um silvo de libertação. Finalmente!...

Com o olhar no chão, reparo agora que estou a caminhar, à razão de uns trinta passos por minuto, e com o olhar no chão! Estando eu a andar tão devagar, ainda estou com medo de tropeçar? Quando ando na correria no trabalho, não ando a olhar para o chão!... Mesmo porque se assim fosse, andava aos encontrões em toda a gente por os não ver!... E isso seria no mínimo constrangedor! Por que razão não vou a olhar em frente? Acho que isto, de quanto mais devagar ando, mais para baixo olho, já é uma imagem de marca. Sempre assim foi! Até já me chamaram uns "nomitos" por este meu hábito de andar com "os olhos no chão".

Fisiólogos e estudiosos da neurologia e da consciência afirmam que os neurónios funcionam e alimentam pensamentos, mesmo com a cabeça decepada, durante cinco segundos!... Como sabem eles dos cinco segundos? E se forem dez? Ou até mesmo trinta como chegam a defender alguns? Estará nessa ocasião a cabeça a não pensar em nada? Isso seria o derradeiro contra-senso!

Se, empiricamente, já cheguei à conclusão de que não se consegue não pensar em nada, em ultima análise porque isso em si, já é pensar em alguma coisa, como é que estando a cabeça em funcionamento não pensaria em nada? Parece-me claro que realmente pensa. Pensa o quê? Quais poderão ser os pensamentos de uma cabeça que acabou de ser decepada do resto do corpo há instantes?
Perdi a vida?
Já está? Finalmente?
Agora é que vai ser?
...

É!... Realmente é um portão. Enorme, forjado em ferro grosso e forte. O ferreiro foi muito sensível ao fazê-lo! Nota-se o detalhe e o esmero no trabalho! Das duas, três; ou ia receber boa maquia pelo trabalho, ou o nobre do palácio que estava por detrás deste portão era um bom homem querido por todos. Também poderia ser só rico pela força do trabalho escravo e do chicote!... Não, não era de certeza! Notava-se no forjado das cornucópias e dos caracóis, uma dedicação suave e meiga...se o contrário fosse, notar-se-ia a raiva e a brutalidade do ferro... O ferreiro, esse não o encobriria!...

© Mário Rodrigues - 2010

terça-feira, 19 de outubro de 2010

Passos

Há passos nas nossas vidas, que são marcados pelos passos que damos na nossa vida de passos vividos e com passos por viver...
Com passos percorremos caminhos, quantos deles, longos e pedregosos caminhos, onde os passos são difíceis e dolorosos...
Dos que já dei, tento reter as arestas aguçadas que me rasgando o dorso ensinaram manhas para os próximos...
De muitos deles, não lhes soube o significado nem sei se algum dia saberei...
Nos que já dei, desgraçadamente, algumas vezes via alguém a meu lado com maior fardo; sim, há sempre fardos maiores. Tive, nessa altura dificuldade em ajudar os outros, mesmo porque nada tinha para além de ouvidos com que escutar lamentos e desabafos...
A cada lamurio que ouvia, sentia-me um pouco melhor, mesmo porque acabava de constatar que tinha sido miseravelmente útil, por momentos, a alguém. Hoje, com passos dados e, espero, muitos para dar, vejo essencialmente o caminho de uma maneira diferente da que via. Vejo também que o que nos pode ajudar não é o caminho que percorremos, mas as memórias e as lições dos passos dados, bem como o propósito e a vontade de outros passos vir a dar!...
E há sempre uma coisa que posso fazer! Escutar!...

(Este texto, hoje, é especialmente dedicado à Cátia)

© Mário Rodrigues - 2010

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

No dia em que os coelhos uivaram.

Nuvens cúmulos cinza negro, arrastadas pelas nortadas furiosas, fazem os tubos de bronze suspensos dos ramos das crespas estepes, ressoarem latidos de proclamação de domínio sobre as tementes mentes.

Iniciara uma nova era!

Os lobos, raivosamente ofendidos por felpudos rugidos nos cumes das escarpas, rasgam as veredas, numa ascensão galopante, para o términos estabelecer em tal ousadia imponderada. Mas algo inesperado aconteceu! Milhares de coelhos precipitam-se -lhes para as raivosas mandíbulas!
Dias antes um coelho moribundo descobrira que, ali no vale dos lobos salobros, a vegetação predominante era a camomila e o hipérico!
Naquele vale, nunca faltavam os coelhos. Eles vinham de todas as partes da montanha. Os lobos, há já muito que nas suas caminhadas migratórias, se rebolavam por sobre as amarelas e perfumadas flores da macela e do hipericão, transportando em seus pêlos, as microscópicas sementes, que semeavam no vale à sua chegada. No vale das águas abundantes, as dopantes plantas proliferavam.
Os lobos bem o sabiam!...
Sempre frescas e saborosas, sem vestígios de dente de leão, cuja diurese poderia desintoxicar, as duas plantas mantinham os coelhos felizes e despreocupados. Os lobos, quais manobradores de marionetas, manipulavam uma sociedade, na pele de cordeiros, demonstrando a sua dedicação em feliz manter aquela chusma de dopados indigentes.
Pois bem, não havia, nos vales das redondezas, roedores mais felizes! Nem que tão abnegadamente tolerassem os residentes e benfeitores lobos. Compreendiam e com agrado, seus irmãos ofertavam, para que a paz e as bênçãos perdurassem!
No vale dos lobos salobros, o lobo líder da matilha, certificava-se da virtude da sua doutrina, ofertando periódica e frequentemente, um abundante repasto concentrado de pétalas de ambas as flores aos coelhos agradecidos. Tal ritual, enternecia e subjugava quem via nos lobos divindades admiráveis, apontando e descriminando os que nos caninos dos lobos não confiavam. Certo era, que naquele vale sussurrava uma paz embriagada há já longos séculos!... De herege denominado, quem não comia era infeliz e assim legitimava as profecias dos canídeos.
Mas, dias antes um coelho moribundo descobrira, que ali no vale dos lobos salobros, a vegetação predominante era a camomila e o hipérico!
Então, milhares de coelhos precipitam-se para as raivosas mandíbulas dos lobos, ofendidos por felpudos rugidos, rasgam as veredas, numa ascensão galopante, para o términos estabelecer em tal ousadia imponderada...e com o temor de que os idiotas roedores, da essência da desventura se tenham apoderado...

© Mário Rodrigues - 2010

quinta-feira, 23 de setembro de 2010

Vertiras e mendades

Desculpai-me mas hoje não falo. Dói-me bastante a cabeça. Tenho nos últimos dias, por força de uma actividade voluntaria que tanto me alegra como entristece, por razões diferentes, escutado histórias e experiencias de vida...
Sinto-me "pesado" e contraído. Depois de escutar uns, escuto e falo com outros... outros que não falam nem escutam uns! Enquanto falo, observo uma postura de pseudo-escuta que faz com que eu me aperceba de que estou a falar um dialecto de uma língua estranha e morta dos confins da existência da humanidade.
Ritmos de vida, faltas de educação ou de princípios, lutas por sobrevivências difíceis ou simplesmente, "estou-me a cagar", criam barreiras compactas e aparentemente intransponíveis entre as pessoas. Neste momento não me sinto muito bem. Um aperto cefálico e a mandíbula serrada com demasiada força denunciam-me alguma raiva... O silêncio em que estou há já algumas horas, concentra as imagens e as frases incompreensíveis que tenho escutado ultimamente. As relações entre os supostos próximos, estão cravadas de "verdiras" e de "mendades". Não temos tempo para ser honestos, verdadeiros e humanos; para nos escutarmos e com interesse em resolver assuntos, procurarmos soluções válidas.
Não falo porque... Hoje prefiro nem escutar... Hoje está nublado lá fora... As imagens são difusas. Não vejo com nitidez. Haverá dias em que inocente, verei as pessoas nítidas... E então, falarei credulamente delas... Hoje não falo...

© Mário Rodrigues - 2010

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Prestar atenção...

A felicidade rodeia-nos com frequência!
Descuidadamente distraídos, vamos sendo infelizes sem necessidade...

© Mário Rodrigues - 2010

segunda-feira, 20 de setembro de 2010

Hoje sou uma simples cobertura de nada!...

Hoje escutei uma história!...

"A noite é demasiado grande!
A escuridão, onde me escondo, ofuscado pelas trevas da ausência da luz, prolonga-se demasiado!
A meio do voo tripulado por um louco, abriram a porta e largaram-me a mil metros do chão!
Vejo as pessoas com dificuldades e embaraçadas. Com inércia, vou até elas. Quando me reparam olho-as profundamente em silêncio até às suas várias cavidades. Depois olho-as nos olhos...
Sim! Ainda em silêncio! A densidade dos olhares é incompatível com sons ou palavras!... Nem mesmo um urro! Imóveis, desnudamo-nos mutuamente, escancaramos os segredos, espalhamos nas mesas as vergonhas, perscrutamos sem pudor as dores...
Ali hirtos! Vejo gotas de amor entre as sobrancelhas... Vejo fios de raiva no castanho de cabelo... Palpebras semi-serradas, papudas, de pestanas afrontadoras e aptas a desferir golpes profundos...
As pessoas são estranhas! São uns seres estranhos, pouco regulares, com extremidades agudas, com labirintos nos olhos e dúvidas nas mãos...
Sim, vi!...
Não! Não perguntaste nada!
Tenho de te dizer!... Tenho de te dizer que a noite é demasiado grande, e que é tão grande que quase me obriga a dormir!
Não quero dormir!
Não posso dormir!
Se um dia!... Se um dia eu dormir... Ela volta a morrer! Mas eu não consigo falar porque a boca se me não abre e o diafragma se me não contrai, expelindo ar revérbero pelas cordas vocais!...
Mas eu tenho de dizer!...
...
Estás a ouvir! Eu sabia que ouvias! Estás inerte, hirto em silêncio...e estás a escutar-me!
...
Ouviste como ele a chamou com voz de ódio descontrolado?
Ouviste como ele lhe ordenou que se despisse e se deitasse nua sobre a pedra da mesa da cozinha?
Ouviste-o a dizer que ia salvar?
Ouviste-o dizer que a amava muito?
Viste-o a agarrar na motosserra e a pô-la a trabalhar e a acelerá-la inúmeras vezes e cada vez mais num frenesim incompreensível?
Ouviste-o a gritar palavras de ordem?
Ouviste-o a exigir-lhe que não implorasse pela vida?
Ouviste-o a dizer que a ia cortar às postas e precisava de se concentrar?
Ouviste?...
Ouviste?
...
Eu... Eu estava dentro da sexta que servia de berço, no quarto, no outro lado do corredor, tinha uma porta entreaberta que deixava que eu observasse pelas frestas das dobradiças da porta...
...
Anos mais tarde... Ainda estás a ouvir, não estás? - Anos mais tarde, ele estava a serrar um tranco de um pinheiro alto! Subira por uma escada até lá. Eu estava de pé, imóvel, em silêncio, hirto...ao fundo das escadas de casa, a cinquenta metros dele. Olhava-o à distância!... Num voo, largado a mil metros do chão, vejo-o a empalar-se num dos postes da vedação!...
...
Não me movi!...
Na minha cabeça, uma tempestade, empurrava-me para a frente!...
O meu corpo, tal como agora a minha boca, não obedece a nada! Não faz o menor movimento. Fico imóvel! Observo o corpo movimentar-se numa espécie de convulsões que se me assemelham a um desenrolar de exorcismo...
Passados alguns abundantes minutos...
Inspiro muito e expiro até ficar vazio!...
Hoje sou uma simples cobertura de nada!...
De nada...."


© Mário Rodrigues - 2010

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

A charrete de tule.



A charrete de tule tinha mil cocheiros sentados em parapeitos nos dorsos de mil cavalos. Os mil cocheiros tinham mil casacas molhadas pelas lágrimas de mil corvos brancos que voavam sob os cascos de mil cavalos verdes com crinas de medo. Os cocheiros divergiam permanentemente em mil trilhos sob novecentas e noventa e nove insurreições dos restantes. Mil chapéus altos adornavam as mil cabeças acéfalas dos mil cocheiros que com mil rédeas de secos nervos de mil homens tangentes, incitavam em mil galopes frenéticos os mil cavalos verdes de cascos de ouro com mil diamantes e crinas de medo.
A charrete de tule voava de portas escancaradas.
A charrete de tule transportava coisa nenhuma em quantidades generosas. O vácuo, aspirava-lhe para o interior nada, sendo que nada de lá saía bem como nada lá ficava.
A charrete de tule tinha mil rodas de cristal que reflectiam imagens de mundos exteriores ao interior do seu mundo.
A charrete de tule era feita de tule. O tule era feito de ânsia e desejo em filamentos de escarpa tecidos em teias de neblina. Por sobre a charrete de tule, deslizavam mil esperanças vestidas a rigor. Mil esperanças de mais não voltar a mil homens que esperavam mil coisas terríveis. Mil homens de mil amores por mil donzelas que voavam, quais corvos brancos sob os cascos de mil cavalos verdes com crinas de medo. Mil terrores eram esperados por mil homens, acéfalos de casacas molhadas pelo suor de mil mães parindo. Mil mães parindo a esperança de mil salvadores, correndo em mil charretes de tule, chegarem ao mundo interior do seu mundo, porque lá fora, no exterior, já mil milhares de milhão de estrelas voavam sensatas e errantes.
A charrete de tule, era a última de mil charretes divinamente enviadas para mil mentiras entregarem a mil homens de mil esperanças maravilhosas, de que com tais mil mensagens divinas, mil vezes fizesse um milhar de alegrias em mil felizes corações de mil homens justos...

Mas, a charrete de tule...


© Mário Rodrigues - 2010

quinta-feira, 9 de setembro de 2010

Realmente não sei se algum dia me sentirei satisfeito...


O ritmo da vida durante todo ano, nem sempre, ou melhor raramente me deixa a serenidade e o silêncio de que não prescindo para fazer as minhas leituras. Frequentemente recorro ao isolamento da sala escura ou ao sossego da madrugada para, quase furtivamente, me deixar embalar e absorver pelas leituras que cada vez menos prescindo. Não obstante tal aventura, há livros que pela sua "densidade", acabo por deixar para as férias. Em período de férias o meu metabolismo desce a níveis perto do torpor. A esse fenómeno, de modo nenhum é estranho o facto, que há já muito cultivo e tenciono continuar, de manter bem longe dos meus olhos e ouvidos, qualquer meio de informação. Jornais, rádio e televisão estão expressamente proibidos de entrar no meu quotidiano de férias. Ao fim de três dias, sem esses autênticos mensageiros da desgraça, o meu humor e saúde mental melhoram numa relação inversamente proporcional aos níveis de adrenalina e excitabilidade em que vivo o resto do ano. Assim, aproveito o facto acordar sempre muito cedo, seis da manhã normalmente, para no silêncio e na calma que o sono profundo de toda a família, bem como com a frescura que manhã proporciona, me entregar a quatro ou cinco horas de "voos literários".
Nestas férias, levei para terminar de ler, um livro muito bom de Gabriel Garcia Marquez, "O Outono do Patriarca" e um outro para começar de Dostoievski, "O Idiota". Sem qualquer previsão acabei por ler pelo meio "As aventuras da Memória" de Voltaire que encontrei em formato "Pocket Book".
Já regressado das ditas férias, visito uma livraria, de que sou cliente assíduo, e entre umas preciosidades de Aldous Huxley, comprei um livro que não era suposto comprar. Raramente compro livros que estão em escaparate, publicitados até à exaustão, com nomes e capas "vestidos para matar" e cujas primeiras páginas tresandam de maravilhosas críticas dos "Guardian", "Observer", "Economist" e "Telegraph". Se me oferecessem aquele livro, certamente que o deixaria a...envelhecer em prateleira de carvalho...até tropeçar nele; mas não só não me foi dado como o comprei. Uma compra muito improvável, mas que num impulso, peguei e levei junto com os outros, para a caixa para pagar. Gabriel Weston. "Confissões de uma cirurgiã". Com "O Idiota" a meio, e na breve olhadela que dou por todos os livros que compro, com o intuito desnecessário de estabelecer a posição cronológica e nunca respeitada, das leituras dos mesmos, cravo os olhos nas páginas do dito e li, li...li mais um pouco e constato que é um "livrito" engraçado. Nada do que trás escrito me é estranho ou novidade. Parece-me que podia, perfeitamente escrever uma coisa daquelas sem grande esforço. Por se tratar de um livro relativamente pequeno, decido lê-lo de seguida e acabá-lo logo de uma vez, para mais rapidamente lamentar o dinheiro que tinha dado por ele.
Três dias depois estou a acabá-lo de ler. Nas últimas páginas encontro aquilo que, por ventura, me deixa a pensar e que eu considero o mais relevante para mim. O livro termina de um modo que eu não previa. Não só não previa, como tão bem me identificava. Num universo de altíssima competição como é este, o hospitalar, há posições e decisões que não esperamos. Muitas vezes nem as compreendemos, ou porque descontextualizados, ou porque nem ponderamos a contextualização.
O facto de em detrimento de uma carreira, optar por uma micro ou nula visibilidade profissional e social, com o intuito de se ser mais pai, mais esposo, mais filho, mais humano, mais partilhado, mais ouvinte, mais conversador...não é, de facto, muito esperado, lógico ou até mesmo bem visto.
Os anos em cujas noites e os dias foram passados nos hospitais, nas farmácias e nas vmer, os aniversários eram dias iguais ou piores que os outros bem como os Natais, Páscoas, funerais e bênçãos de fitas, dias importantes como os em que os filhotes mostram a dança das borboletas nas festas de fim de ano...foram-se acumulando.
Lembro-me da minha mulher passar por um dos hospitais, quando a caminho da faculdade, para me dar um beijo, porque não nos víamos há três, quatro ou cinco dias. Lembro-me de um dia, depois de dois beijos e um café rápido, a ficar a ver ir-se embora e pensar - "...aquela mulher é-me quase estranha!... - A distância tem sido tal, que...chego a ter uma sensação de viagem para o infinito sem regresso...
Se dessa vez, uma chamada na vmer me fez voltar à vida no fio da faca. Mais tarde, já em contexto de bloco operatório as coisas mudaram. Chegava a casa de madrugada, quase todos os dias, e em bicos de pés, deslizava até ao quarto dos meus filhos, pequeninos, e os cheirava, e observava... e acariciava os punhos fechados, num misto de força e fragilidade... sentia-os desprovidos...
Nas minhas inúmeras noites de serviço, quando o trabalho permitia, tinha por hábito passear pelos corredores das enfermarias, não só para "piscar o olho" aos meus colegas que também estavam de "vela", mas também para observar os doentes nas suas eventuais tranquilidades. Lembro-me de achar a neonatologia e a pediatria com uma angustiante semelhança à medicina interna. Se de um lado bebés e do outro idosos, mas ambos sós!... Lembro-me de lamúrias e lamentos que mais não eram que pedidos de - "por favor chega-te a mim um pouco...olha para mim e deixa que que olhe também..." - Lembro-me de bebés que o simples timbre da voz da progenitora os fazia calar e acalmar de choros sentidos...
Os meus; eu sabia ser o "super-herói" que eles exibiam aos colegas, mas não sabia se eles tinham feito cocó, ou se tinham comido bem, ou se tinham tido alguma rixa com os colegas da creche, lá estavam, de certo modo também sós... Também sabia que tinha mais uns trocos para, com eles e a mãe, fazer coisas que nunca fazia porque não estava a quando das oportunidades. O que eu não sabia, mas aprendi, asperamente, é que eles não precisavam de um super-herói nem de uns trocos... nem eles, nem a mãe deles, nem eu, nem os meus pais... o que nós precisávamos eram tão simplesmente de nós, eventualmente com menos trocos e heroicidades, mas verdadeiros e disponíveis.
Hoje esforço-me para ganhar algum dinheiro a fazer o que gosto. Faço algumas coisas de que gosto muito e me dão um prazer imenso, mas que no entanto, quase pago para as fazer, mas principalmente, estou envolvido numa densa vida humana que me abraça inebriantemente como se fosse um polvo. Parece-me permanentemente, que deveria dar mais atenção e de mim aos outros, sinto que devia sempre ir mais além, devia dar sempre mais um pouquinho, poderia dar, tenho de dar. Realmente não sei se algum dia me sentirei satisfeito...possivelmente não!...

© Mário Rodrigues - 2010

quarta-feira, 8 de setembro de 2010

Perfume inebriante...

...E então dizia um cronista da época acerca dos romanos a quando das lutas com os povos do norte...

"...Os romanos, não gostavam dos Normandos porque eram feios e não cheiravam nada bem!... Não é que o cheiro a gordura de Yak podre fosse mau... mas já estavam habituados ao perfume do azeite mediterrâneo rançoso!..."

© Mário Rodrigues - 2010

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Afinal passaram vinte minutos...


Deveriam ser umas sete e meia da manhã e acho, que já estavam aí uns...montes de calor ainda tão cedo. Eu e meu filho, já estávamos dentro do carro, prontinhos para dar início à viagem para os penhascos. Como habitual, esperávamos que a mãe e a irmã se viessem juntar a nós para partirmos. Depois de enormes minutos lá chegam elas e debaixo dos protestos do "machedo" lá partimos.

Depois de uns bons quilómetros de auto-estrada, saímos, e entramos na estrada nacional que serpenteia por vales e montanhas pelas verdes serranias. Alguns quilómetros mais à frente vejo, na beira da estrada, uma moto mal estacionada, alguém sentado no chão de costas para a barreira da berma e mais duas pessoas de pé, num certo frenesim.
Parei, saí do carro e fui tentar aperceber-me do que se passava. Enquanto me dirigia para junto das pessoas, fui-me tentando convencer de que me agradava a ideia de o indivíduo apenas estar mal disposto pelo calor ou alguma hipotensão ou hipoglicémia, enfim, nada que viesse a exigir de mim "mexer" mais a sério na "coisa", mesmo porque já há alguns anos que nada faço na matéria e tenho noção da "ferrugem" nas capacidades e na velocidade de discernimento, a rapidez de acção e o olho astuto...já tiveram melhores dias.
Ao chegar junto das pessoas vejo o homem que estava sentado no chão, um indivíduo que aparenta uns quarenta anos, de estrutura larga e um pouco obeso, numa ortopneia bastante acentuada e pergunto o que se passa. À minha pergunta as duas pessoas dizem que também acabaram de chegar e que nada sabem do assunto. Eu coloco-me de joelhos e interpelo o indivíduo que me responde com muita dificuldade que ia a andar na sua mota quando lhe entrou uma abelha para a boca. Apercebi-me que o insecto terá sido inspirado ou ingerido visto que ele diz que a não cuspido.
Perguntei-me como tal teria acontecido e reparo para o capacete no chão, parecido com aqueles capacetes da primeira guerra mundial, de ferro com umas abas de volta. Lembro-me de que uma vez, numa situação parecida, eu ir com a camisa um pouco mais desabotoada e me ter entrado uma vespa que prontamente me ferrou na barriga junto do umbigo.
Volto a pergunta-me a mim mesmo como me fui meter naquela. Se por um lado a falta de treino e de material, no meio do nada, me levam a desejar nunca ter por ali passado e correr o risco da "coisa ficar feia", por outro lado imagino o homem ali, assentado no chão e duas pessoas de pé a observa-lo a asfixiar até à morte...

"Chamem uma ambulância rapidamente!..." - disse eu num tom quase imperativo. Sentia um misto de vergonha e de força...

Se tivesse aqui o meu antigo Golf, (carro com que trabalhava no INEM, no século passado), carregado de material até às pestanas...um nasofibroscópio... Precisava de lhe observar a cavidade bocal até lá abaixo à laringe, precisava de saber se, tal como suspeitava, ele estaria com um edema na glote...
O homem estava em franco sofrimento. A dispneia provoca-lhe a sensação de morte eminente...tenho de fazer alguma coisa...ponho-lhe uma pedra debaixo de uma das mãos e o capacete debaixo da outra para que com mais espaço de flexão para os braços e músculos abdominais ele consiga respirar alguma coisa. Com uma cana e uma lanterna de bolso consigo improvisar um laringoscópio. Obviamente não consigo confirmar se a glote inchada, devido à ferroada da abelha, lhe está a obstruir as vias aéreas. Penso no que posso fazer e vejo que não tenho nem um laringoscópio nem um tubo endotraqueal para lhe tentar meter...adrenalina ou epinefrina para lhe administrar...ainda menos!... Oh!...se pelo menos eu aqui tivesse o Dr. Helder!... Aquele homem era imparável! Aprendi muito com ele. Tinha uma mão e um treino extraordinário. Costumávamos partilhar o "olho" astuto. A esta altura já ele tinha administrado a epinefrina e já o homem ia a caminho do hospital...

Sou assaltado por um arrepio gelado no dorso!...

O homem vai-me morrer aqui nas mãos asfixiado!... Tenho uma última hipótese! Mas eu não sou médico, muito menos cirurgião, já não faço nada disto há já muito e mesmo quando fazia, nunca fiz uma traqueostomia de emergência! Não estou no bloco, quem me dera, não tenho anestesista, nem sequer um bisturi...
Pergunto se alguém tem alguma coisa gelada que me traga. Com latas de Coca-Cola e cerveja que um tinha e a água bastante fria que corria numa bica, ali perto da estrada, molhei e arrefeci uma toalha tanto quanto possível e coloquei-lhe na garganta para conseguir algum efeito vasoconstritor no sentido de diminuir o edema e reduzir a hemorragia no caso de eventualmente avançar para a loucura de abrir um acesso na traqueia. Com a ajuda dos outros, posiciono-lhe a cabeça, permitindo algum alongamento com o objectivo de facilitar a passagem de algum ar. Enquanto isso, vou-lhe contando os anéis cartilaginosos da traqueia e imaginando os dois que iria cortar para o acesso perto do esterno. Penso com o que é que lhe ia fazer a incisão. Penso se o alívio da abundante golfada de ar que iria inspirar após a abertura do acesso lhe compensaria a dor e o trauma de não estar anestesiado. Mas, ali, ou era um vivo com dores ou era um morto à espera de uma anestesia...
Nunca fiz nada disto, mas se o não fizer o gajo morre! Entre uma e outra...vai ter de ser esta a primeira vez!...Peço para me trazerem umas luvas de látex que tenho na mala do carro para quando tenho de mexer nos pneus, o frasco do álcool dos primeiros socorros, primeiros socorros...valha-me Deus...aquilo não socorre nada nem dá para fazer nada...mas enfim, o canivete suíço que o meu primo me deu e que, geralmente, costumo manter afiado e levamo-lo para um local mais fresco e mais confortável.

"Que vai fazer?" - Perguntaram-me os outros - "...está maluco? Sabe lá o que vai fazer? Mas afinal quem é você?"

Realmente reparei que nada tinha dito em relação a isso... Não quis entrar em pormenores... Quem sou eu? Sei lá eu bem quem sou eu! Só sei que tenho medo de matar um homem que morre se eu não fizer nada!... Ouço as sirenes ao longe, o homem também se apercebe do mesmo, eu digo-lhe que agora estamos melhor e que ele vai-se safar. A ambulância chega. Digo o que se passa e logo se procedeu com ventilação mecânica. Pedi um laringoscópio de emergência e com receio de já não saber fazer, coloquei o tubo endotraqueal. O homem inspira uma quantidade extraordinária de ar de uma só vez. Olha para mim, olhos nos olhos, e eu digo-lhe - "já te safaste!". Foram-se embora para o hospital...
Voltei ao carro. Sento-me exausto. Penso que, com a idade perdi muito treino, mas talvez tenha adquirido o medo para ser muito mais cauteloso e esperar pelos passos adequados. Noutros tempos, com mais treino e material, a coisa teria, certamente, sido diferente, mesmo porque havia o Dr. Helder que fazia e eu ajudava... Desta vez, sem treino e sem rede, caí no palco com um papel para o qual nunca tinha estado preparado nem já mais tinha ensaiado.

A viagem sofreu um atraso de vinte minutos. Reparo que me pareceu ter passado horas para a ambulância chegar, mas que afinal...afinal passaram vinte minutos...


© Mário Rodrigues - 2010

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

E um dia... Um dia veio a testosterona!...


Estava eu com o pupilo de pé à beira do mar a olhar as ondas, lado a lado, numa amena cavaqueira quando...
...
"...pai, isto este ano está demais!"
"Pois está! O mar está muito mais parado que os outros anos!"
...
"Não pai!... As mulheres!... Este ano isto está cravado delas e... giras... e... boas...!"
...
"...Ahah!... Epá!... Yap!...; elas já andam aí há muito tempo!... Tu é que só as estás a ver agora!..."
...
"...Ahah!... Epá!... Yap!......"
...


© Mário Rodrigues - 2010

quinta-feira, 19 de agosto de 2010

O melhor do mundo são as crianças!...

sexta-feira, 30 de julho de 2010

Hoje, principalmente, a "Conversa da treta" continua!...

Muito obrigado António...
Até sempre!...

quarta-feira, 28 de julho de 2010

Só posso cheirar muito mal!...

Ontem, enquanto carregava uma considerável quantidade de caixas nas mãos, ia a entrar para um dos edifícios em pleno "Marquês do Pombal", no centro da cidade de Lisboa, quando o sapatinho do menino escorrega na pedra polida do degrau da entrada, e eis que, o menino dá três piruetas e dois mortais, estatelando-se no meio da bela calçada lusitana, rodeado de trinta e seis pequenas caixas de cartão.
Se é certo que efectivamente de modo algum me magoei, também é certo que o máximo que obtive dos vinte ou trinta compatriotas que assistiram ao número de circo, foi umas risadas e uns chutes numas caixas que ficaram a estorvar o esvoaçante andar de uma bela menina. Ninguém, mas rigorosamente ninguém, esboçou o menor gesto de ajuda a levantar-me ou a apanhar as ditas caixas!...
Isto só pode querer dizer uma coisa... Só posso cheirar muito mal!...

© Mário Rodrigues - 2010

sexta-feira, 23 de julho de 2010

Para mi niña Lita del Carmo



Já a feiticeira Lua espreitava quando de ventre de mãe "jorraste". Senti-te a chegada no clamor da vitória...

Qual gata independente dengosa exibes teus olhos negros de menina
Águas fartas selvagens caídas, teus negros cabelos, fios de vida e de força

Mi niña...mi niña...

Rio de esperança, irreverência pura
Firmamento de estrela das noites de Sol

Em ti trina cordas de aço às mãos de...um alegre cigano
Não deixes que de teus olhos saia a alegria

Rosto pleno, toque veludo, morena cor
Não deixes que de teu corpo saia a primavera

Não deixes que jamais me não lembre o que sentia

Mi niña...mi niña mia...
Mi niña...mi vida...

© Mário Rodrigues - 2010

quinta-feira, 22 de julho de 2010

Voavam vindos...do sul...

Voavam vindos...do sul...ou talvez mesmo de norte ou do leste...
Voavam; companheiros, guerreiros e amantes...
Voavam por entre brisas que os acariciavam como mãos "voludas" de mãe mulher... Terna fúria de ventre quente...de mãe querida e desejosa!
Voavam, voavam...voavam...voavam...
Tão perto, ao longe; terra imensa doçura plena no coração uma estrela fez brilhar...
...juntos num só encarnaram num novo voar!
Rebelde e audaz de rompantes enérgicos que em picados voos aterrorizava os pedaços de terra saltados no encalço de tal fúria de vida. A vida estava-lhe nos caninos como faca exibida e rosa rubra afrontada...

...Tinham voado até ali... Agora com urgência viam as habilidades exuberantes e perigosas daquele raio de vida... Raio bento de desconhecimento da dor das veredas cravadas no dorso e na alma...

...Mas isso agora nada importa! O raio de vida, por eles encarnado num novo voar...voava, voava, voava...voava...

© Mário Rodrigues - 2010

domingo, 18 de julho de 2010

Resposta de Cybe a Aviãozinho de papel...

Este, é um texto publicado pelo meu amigo CybeRider em "O primeiro voo do albatroz", em resposta ao meu anterior. A importância e o valor humano e sentimental dele, exige que eu lhe preste honra, publicando-o aqui no Recanto. Entendo que estes dois textos, o meu e posteriormente o dele, em conjunto formam uma grande interrogação à existência do homem.


"Ao Mário Rodrigues que encontrou um aviãozinho de papel


Um dia peguei nele e deixei-o sozinho no meio do mundo.


Já não havia a minha força a embalá-lo e a subtraí-lo à chuva. Voltei para as coisas, simples, pequenas e fugazes, como penugem, a recordar-me que todo o significado da minha vida estava ali para trás, a cada metro de cada quilómetro que ia somando a noite à distância, se pudesse ter olhado para trás já não o veria, nem conseguiria prosseguir. O caminho árduo que conduzia ao meu destino embaciava-se agora com frequência. Finalmente parei, a uma distância que, por segurança, já tornava difícil o retorno. Parei, esfrangalhado.


Foi assim que ele abriu as asas e voou, pela primeira vez. Foi dos dias mais tristes da minha vida, e no entanto a felicidade teria mais lógica, a irracionalidade é por definição inexplicável. Ainda sinto que fui eu quem o empurrou do penhasco, embora todos me digam que não, que aquele acto de pura loucura foi o que havia a fazer, que isso era o bem, a norma, afinal . As asas, essas, eram só dele. A fé no seu voo terá sido minha, minha... Que nem sou um homem de fé. Onde arranjei a coragem? E se ele, a meus olhos implume, não tivesse conseguido? Que tremenda imprudência! A única, a fundamental. Todas as outras são brincadeiras a comparar com aquela cedência que cumpri sem reflectir. Se reflectisse ele não voaria, talvez nunca, e um dia já não saberia voar sozinho.


Mudou-se o centro do universo, que antes via agarrado ao meu umbigo, mas agora só posso imaginar. As primaveras deixaram de ser só uma vez por ano, mas os invernos também. No entanto recordo que também eu abri um dia as minhas asas frágeis e me atirei desse penhasco, esfrangalhando, como compreendo agora, tudo e todos.


É a sina de quem não conseguiu transformar o mundo num lugar seu, de quem se limitou a construir um pequeno quadrado inóspito e dependente. Culpei-me, naquela paragem forçada, por cada passo mais imprudente e por cada decisão mais conformista e inerte. Se, se, se... Tantos ses que me davam a possibilidade daquela partida precoce poder ter sido adiada, e todos a colocarem-me no cerne daquela consequência. Nenhum sofrimento por antecipação que me tenha ocorrido me aliviou sequer um pouco do peso que, embora não se compreenda, acaba por se carregar, porque deriva de termos falhado na conquista suficiente do reino onde a nossa lei seria a medida da protecção que queremos para o nosso clã, que entregamos assim aos verdadeiros senhores do universo, e às suas questionáveis leis, que nos submetem também a nós.


Compreendo que é essa vassalagem que me consome, como nem consumiu Abraão ao entregar o seu filho a um deus. É uma troca injusta porque nada tenho a pedir que me sirva, nem protecção divina que houvesse, porque toda a que quero é só para ele, nada justifica tamanho desequilíbrio. Naquele momento entreguei ao incerto o somatório de tudo o que fui e a continuidade que justificará, para o bem ou para o mal, o pó em que me tornarei.


Passa um ano e outro, cada um não me apazigua a saudade que sinto de cada vez que ele inicia um novo percurso, ainda no momento da partida; nem o temor do momento em que o vejo tentar cada nova aterragem por que anseio, ainda bambaleante, depois de cada longa permanência perscrutando o céu infinito, que apenas adivinho.


Voltando ao ponto de partida, é a penugem que já não consigo olhar. Tudo permanece como que a aguardar que o tempo se inverta e que ele volte para brincar com as quinquilharias desvalidas que para mim são autênticos tesouros, fechados naquela arca, que chegou a ser um quarto, agora mero poleiro, de onde desejo, com frequência, perder a chave de vez.


A esperança que resta é de que a sua liberdade, que muito me apraz, lhe dê, a ele ou aos descendentes, a possibilidade de zelar melhor pelos seus e pelo seu universo, para que não tenha de abandonar um dia no meio do mundo alguém que seja parte integrante de si. Mas sei que peço o inexequível.


Sendo essa provação absoluta e incontornável, sei que no dia da dele, esteja eu morto ou vivo, também assim me realizo.


© CybeRider - 2010"

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