sábado, 27 de fevereiro de 2010

Mas o Tiago disse logo que assumia...

"Para mim estás morta! Ouviste? Morta! Sabes o que é? Sai-me da frente...porca, puta..."

Foram estas as últimas palavras que ouvi da boca dela. Eu fazia-lhe tudo o que podia...tomava conta dos meus irmãos...limpava a casa bué vezes...mas já estava farta! Bêbado! Chamava ela ao meu pai...talvez fosse! Não tanto como ela. Ela para além de bêbeda é má!
Tinha doze anos, quando me apareceu o período a primeira vez. Ela, quando eu corri a dizer-lhe, assustada por não saber o que se estava a passar, disse-me:
"Não sabes o que é? Deixa que não vais morrer! E se morresses, também não se perdia nada...não te ponhas a pau, não...aparece-me prenha...que ponho-te no olho da rua"
Quando olho para eles tenho medo! Tenho medo de os não conseguir tratar como deve ser...são tão pequenos e...frágeis...se pelo menos eu tivesse já os vinte! Se calhar conseguia arranjar trabalho e seria diferente...arrendar uma casa...mas, ainda faltam quatro anos! O Tiago, o meu namorado, ele é tão fixe comigo! Apesar de ainda só ter quinze, é um homem! Foi espectacular...quando ele chegar, tudo vai ser diferente. Lá na Suíça, quando ele me escreveu disse-me, que anda a guardar uma manada de vacas muito grande, e que já juntou seiscentos euros para os nossos meninos. Diz que depois vai fazer uma casa e que vamos viver à grande! O primo dele já lá está há muitos anos. Também guarda vacas. Diz que a manada dele é de vacas melhores...
Os "stores"!...aquilo era uma seca...
Esta cena de gémeos, é que me faz muita confusão!...não sei! São iguaizinhos! Menos a orelhas!
Aqui, há umas que são porreiras, mas outras falam à bruta...O Dr. Luís é fixe!
A senhora Amélia ensinou-me montes de cenas! Ela é muito fixe!
Não, eu não sou essa cena da mãe solteira...está bem que não me casei. Mas o Tiago disse logo que assumia...

© Mário Rodrigues - 2010

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Um amor entre arames...

Verde era a cor predominante. Ali numa pequena várzea no leito do rio, alimentava-se enquanto passeava. Havia uma pequena cerca que dividia o campo em dois. Do outro lado, num faustoso e imponente andar, andava ele. Dorso castanho claro, barriga castanha mais escuro e as patas pretas. Pescoço curto, ar emproado e uma bela e longa barbicha. Ela deste lado mirava-o insuspeita, o que aliás ele também fazia. O branco e o beije mesclavam-se de um modo único, transformando-a numa verdadeira visão Afroditesca...
A tentação estava a tornar-se insuportável. Ela deslocando-se como se de uma pétala de flor de amendoeira se tratasse, vai até junto do rio para bebericar um pouco de água. Ele, a quem nada passava despercebido, muito menos os movimentos da "Bita", em três saltos e um pinote, se pôs junto dela, ainda que do outro lado do arame... Entre olhares e "mmeees..." suspirados, ele começa a fazer contas de aritmética para calcular o ângulo da corrida para saltar a coisa... Dá uma corrida atrás e...
"HHEEE..., ANDA CÁ SEU CHIBO D'UM CABRÃO..."
"Raios partam a velha que anda sempre a meter o nariz onde não deve...", sussurra ele com os seus botões... "Deixa lá que eu já te digo..." dá mais uma corrida atrás e num ápice, salta o arame para junto da sua amada "Bita"...
Pois claro! Está visto o que ia dar!
Duas pedradas e um cajado a voar ditaram a desdita... Se ao menos não fosse aquela maldita mania de marrar em tudo o que era muro... nesta altura teria uns belos cornos, que com sorte, se enrodilhavam no cajado, adiando desta feita tal desventura.
Ali jaz o "MOCHO" aos pés da "Bita".

-"HHAAA... MOCHO D'UM CABRÃO, QUE ME DÁS CABO DA VIDA..."

Tudo era da mais alta qualidade. Nem admitia que fosse de outro modo. As tigelas são de um barro cinzento-escuro, feitas lá para o lado do Lameiro. Os pimentos, tiveram de esperar umas tardes de verão até que um vermelho vivo se apoderasse deles. Só depois foram colhidos e preparado o pimentão. O louro. Bem, as folhas de louro vieram d'O Loureiro. Árvore de enorme imponência. De tal modo que o vale, as terras e a "poça" eram apelidados de "Loureiro". Os alhos tinham sido vizinhos dos pimentos e tinham secado à sombra, só para manterem o aroma.
"Tenho pena. Realmente tenho muita pena, mas as manhãs a lambuzar-se com as bolotas e as tardes de "sorna" à sombra dos sobreiros... enfim, a banha era de uma textura, de um aroma, de uma fineza suprema... ". Morangueiro. Não, não é americano! É morangueiro...o perfume não deixa enganar... Baco emocionava-se quando sorvia tal néctar. Na semana passada, com todos estes meus amigos, em doses rigorosamente delicadas, fui colocado nas tigelas. O sal e o tomilho estiveram mesmo para não entrar. Sempre cheios de humidades... mas depois de os inspeccionar, acedi. Tudo tinha de ser da mais alta qualidade. Depois e só depois fomos completamente cobertos com o vinho, o morangueiro.
Ontem, foi dia de cozer o pão de centeio. Que cheirinho se espalhava pela aldeia...hhuumm! Depois de cozer o pão, o Sr. José, que era uma jóia de pessoa; aliás não sei como consegue aturar aquela "penca" daquela velha pastora, deu mais um ligeiro calor ao forno com umas vides e uns galhos de oliveira secos e... mas que maravilha... espectáculo... extraordinário... aquele calorzinho... hhuuummm! Ficámos a repousar a beleza...Hoje, estamos de saída do forno. Nem vos conto...
Já ouvi falar num tal de "Dão", que também por cá está...

O Sr. José já chamou o pessoal. "Meninos... a chanfana está na mesa..."

© Mário Rodrigues - 2010

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Então e o mestre?

"Quando o estudante está realmente preparado, o mestre aparece."

Provérbio Budista

A noite é para se trabalhar

Pela madrugada recebi um telefonema que me trouxe de volta ao mundo dos vivos. Tenho mais que fazer... Só vim cá para dizer isto! Podia perfeitamente não ter vindo... Mas vim!

© Mário Rodrigues - 2010

terça-feira, 23 de fevereiro de 2010

Sinto-me inútil

Hoje não me sinto lá muito bem. Já é noite e estou com a sensação de que não fui útil a ninguém... Sinceramente estou incomodado e algo ansioso!

© Mário Rodrigues - 2010

Bichos...

Se não conheces as carraças...Tem cautelas com o cão!

© Mário Rodrigues - 2010

sexta-feira, 19 de fevereiro de 2010

Entre vampiros

Oh pá! Chupa-me a jugular...

© Mário Rodrigues - 2010

A propósito

A propósito do Post "Então a ver se depois combinamos alguma coisa. ", in blog "O Bom, O mau e o Vilão".

Agora que te leio, reparo que já tinha reparado nisso mas que, por uma piedade estúpida mais de mim do que dos outros e por não ter outra coisa para dizer naquelas horas...ou espera aí!
Não tinha?
Realmente tinha outra coisa para dizer, do género:
"Lamento mas não contes em voltar a ver-me e a divertirmo-nos juntos", partindo do pressuposto que assim foi, porque se não foi a conversa teria de ser outra, "porque eu tenho sempre montes de tempo ocupado a arrastar-me por este mundo que vejo por um buraco de fechadura, e se combinasse imediatamente alguma coisa contigo, ias ficar a pensar que eu era um gajo que tenho sempre montes de tempo ocupado a arrastar-me por este mundo que vejo por um buraco de fechadura, logo era um inútil e deixarias de gostar de estar comigo, assim como supomos que gostamos. Poderias mesmo pensar que eu tinha gostado tanto de estar contigo, que estava desejoso de voltar a estar. Possivelmente porque agora que estive contigo, antes de combinar a próxima vez, na realidade não estive lá muito porque tinha de te contar todas as enormidades que tenho feito ou nem por isso e gabar-me e babar-me e não sei que mais, sendo que teremos de voltar para mais..." Mas isso, isso seria uma falta de educação!

© Mário Rodrigues - 2010

sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010

Parida para morrer...

A pedra estava gelada. Sentia uma perfusão gélida que me anestesiava as nádegas. O dorso vergava-se-me. Tinha a sensação de o coração ter diminuído, lenta, mas claramente os seus batimentos... Mal o sentia! Os olhos vidrados fixavam-se no horizonte...
Bastante ao fundo, havia um monte redondo com uns arbustos mesmo na ponta. Parecia uma mama.
Não me lembro de ter mamado!
Não me lembro de ter sido uma criança feliz!
Um dia... Um dia o mundo acabou! Pareceu-me que assim tinha sido!
O cheiro era nauseabundo. A gritaria, que incluía várias línguas e idiomas por mim desconhecidos, era-me alheia bem como o chiado das rodas nos carris... Em silêncio, pelo único rasgo de mundo que me era visível, via-a a ficar longe...mais longe...bastante longe...muito longe... Desapareceu! Da vista, do meu alcance e...Era uma mulher castigada pelo trabalho brutal, pela fome e pelos espancamentos do monstro... (cuspi três vezes para o chão e limpei a boca com a manga da camisola). O ódio saltou-me de dentro como um vulcão que me aperta a garganta e quase me asfixia... Miserável... Nojo... Por muito que me lave, ainda não estou limpa, nem vinte e oito anos depois... Não sei se me virei a sentir limpa algum dia... Apesar dos lábios serrados, gritava em brados estridentes "Mãe, Mãe, Mãe..." em sussurros de um silêncio insuportável... O mundo acabara de acabar!
A minha mão direita deslizou lentamente e encontrou a mãozita dele. Também ele, silencioso e imóvel. Que pensará ele da vida? Que achará ele, no seu mais profundo intimo, de mim? Não tenho coragem de lhe perguntar! E eu? Que penso eu de mim? Sei demais para pensar o quer que seja. O meu corpo, sim porque só o meu corpo interessou, foi um "local". Sitio onde, entre outros, eu própria estupidamente me mutilei. A beleza bastava-me num "lambuzante" banho de narcisismo. O meu corpo voltou a ser o meu nó Górdio...
Mas ele, o polvo através do qual eu toco em todo o universo, saiu-me do seio como a lava irrompe das entranhas da terra. Com ele tenho a possibilidade de me rasgar em pedaços atirando-me para a fogueira, recomeçar a minha vida... Nunca é tarde... Nunca será tarde... Recuso-me a deixar que entardeça!
Poderei eu nascer trinta e quatro anos depois de ser parida? Não sei. Nem sei se isso me preocupa realmente.
Ele puxa-me a camisola e procura as minhas mamas. Eu acordo de um sonho mau. Poderás perfeitamente ser diferente de todos eles. A minha lágrima escorre-te no rosto, mas tu, serás diferente de todos eles...

© Mário Rodrigues - 2010

quinta-feira, 4 de fevereiro de 2010

O navio de espelhos

O navio de espelhos
não navega cavalga

Seu mar é a floresta
que lhe serve de nível

Ao crepúsculo espelha
sol e lua nos flancos

Por isso o tempo gosta
de deitar-se com ele

Os armadores não amam
a sua rota clara

(Vista do movimento
dir-se-ia que pára)

Quando chega à cidade
nenhum cais o abriga

O seu porão traz nada
nada leva à partida

Vozes e ar pesado
é tudo o que transporta

(E no mastro espelhado
uma espécie de porta)

Seus dez mil capitães
têm o mesmo rosto

A mesma cinta escura
o mesmo grau e posto

Quando um se revolta
há dez mil insurrectos

(Como os olhos da mosca
reflectem os objectos)

E quando um deles ala
o corpo sobre os mastros
e escruta o mar do fundo

Toda a nave cavalga
(como no espaço os astros)

Do princípio do mundo
até ao fim do mundo


Autor : Mário Cesariny

terça-feira, 2 de fevereiro de 2010

Vivas! Hoje é dia de festa!

Hoje é um dia grande no meu bosque. Chegaram uns distintos habitantes que há muito eram aguardados. Envergonhadamente espreitavam por entre todos os aparatos que lhes garantiram que uma viagem de alguns milhares de quilómetros, lhes não deixava marcas. Chegadas e dadas as boas vindas, foram colocadas em terra rica e húmida, num local resguardado de quarentena. São ainda pequeninas, mas são muito bonitas.

Sequoiadendron giganteum - Sequóia Gigante
Taxodium distichum - Cipreste de Folha Caduca
Picea pungens - Abeto Azul

© Mário Rodrigues - 2010

segunda-feira, 1 de fevereiro de 2010

Tempo transversal à existência

Neste fim-de-semana, tive a oportunidade de estar junto de uns seres extraordinários! Digo extraordinários, não porque esta palavra se encaixasse mais ou menos bem aqui no meio destas outras, mas antes porque aqueles seres o são mesmo!
Calculo-lhes a idade, mas com esse cálculo surgem-me na cabeça coisas como as histórias a que assistiram. As nossas existências médias de setenta, oitante, noventa ou até mesmo de cem anos, aprisionam-nos numa existência temporal finita, que com ela traz uma estúpida forma de vida, também ela finita, de horizontes estreitos, espartilhados...de sabor salobro, dada a sua exígua mensurabilidade.
Com dificuldade, e nunca sem esforço, apreendemos a existência de tempos infinitos anteriores e posteriores às nossas existências. Parecem-nos algo de menor importância face aos tempos que estamos a viver. "Estes sim...", parecemos nós dizer, dos altos das nossas tribunas de palha de milho, como se jamais tivesse havido e voltasse a haver momentos na história como aqueles em que estamos a viver.
Com muita frequência, vou lendo inúmeros exemplos de pensamentos, raciocínios e conclusões, que me parecem e são, absolutamente contemporâneos apesar de a sua origem ter muitos séculos e o seu desenvolvimento muitos milénios. Nós somos apenas os detentores dos restos, que sendo bons ou maus; já sei que esta classificação em si já é putrefacta, dos anteriores habitantes de uma presunção de imortalidade mesquinha e microscópica como a nossa. Uma árvore que independentemente das suas características físicas, assiste à minha passagem pela face da terra, como se de um instante se tratasse, tem um acumulado de legitimidades, difícil de entender e compreender. Assistiram a coisas como o vomitório romano e o masturbatório grego, que são coisas que nos deixam confusos, principalmente porque julgamos que isso deveria estar para a frente temporal e não com o passado de milénios. Aproximar-me de um tronco que tem oito metros de diâmetro e que eleva uma copa a cinquenta metros de altura, é intimidatório e arrepiante, mas, se lhe encostarmos o ouvido, podemos ser embalados em histórias intemporais de duendes e princesas, de animais e de namorados...numa existência serena. Como poderia eu, um dia, decidir acerca da sua existência...

© Mário Rodrigues - 2010

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