Mostrar mensagens com a etiqueta Constatações. Mostrar todas as mensagens
Mostrar mensagens com a etiqueta Constatações. Mostrar todas as mensagens

quinta-feira, 1 de setembro de 2011

O oscar e a tartaruga

Ok!...
Finalmente encontrei um parceiro à altura para o meu confessor!
O meu amigo Oscar (Astronotus ocellatus), conhecido por “o peixe”, incomodado com uns certos habitantes do seu aquário, foi lhes demonstrando que a democracia é muito bonita desde que seja ele a mandar! Certo?
Ao que parece, este seu temperamento não foi sendo muito bem compreendido pelos “amigos”, a tal ponto que se viu obrigado a... digamos subtraí-los... ao espaço envolvente. Assim, e como resultado dessa sua politica, ficou sozinho no aquário.
Os dois Plecostomus”, com a sua forte caixa óssea e escamas agressivas, ainda pensavam que venceriam a guerra... Não! Um após o outro, foram também eles, engolidos e digeridos ao longo de quase duas semanas, tal como o Corydora!
Ao fim de dois meses de solidão, o meu amigo Oscar encontra-se melancólico e imóvel flutuando só, no imenso aquário. Desesperado de tanta calmia, abandona as suas cores vivas apresentando-se desmaiado e adormecido a quem o visita.
Hoje, olhando para ele, tive uma ideia!
Uma tartaruga!
Uma tartaruga tem as características adequadas a um ditador! Jovem, irrequieta, comilona e o mais importante, tem uma casca dura e dez vezes maior que a boca do meu amigo.
Ele agora, o Oscar, é vê-lo em correrias no encalço a nova amiga. As suas cores vivas voltaram e a sua vida deixou de ser uma tristeza.
Poderíamos tirar várias reflexões disto! E não estou a falar só de biologia!
Há aqui lições sociais e politicas a tirar ou é impressão minha?
© Mário Rodrigues - 2011

quinta-feira, 20 de janeiro de 2011

Copulou freneticamente enquanto roía uma cenoura...

Passei pelo jardim zoológico e perguntei baixinho, por vergonha, a um babuíno se estava preocupado com a vinda do FMI a Portugal. O indivíduo ignorou-me, virou-me as costas e correu ávido para junto de uma fêmea com quem copulou freneticamente enquanto roía uma cenoura... Há vidas melhores! São é mais baratas… 

Bem sei que esta é uma reedição! Mas é tão...

© Mário Rodrigues - 2011

quarta-feira, 22 de dezembro de 2010

As forças interiores e outras trivialidades...

Contava Roberto Rosselini...

Um agricultor num dado dia, levou consigo o seu filho e Borino o cão. Na sequência dos seus lavores, deixa a criança e o cão debaixo de um grande carvalho. Horas depois, quando regressa, encontra a criança degolada com marcas de dentes na garganta. Com o coração destroçado de dor mata o cão. Imediatamente após vê uma serpente enorme e toma consciência do tamanho da injustiça que acaba de cometer. Perturbado coloca respeitosamente o animal numa cova coberta de rocha e colocou-lhe uma inscrição que dizia - “ Aqui Jaz Borino a quem a ferocidade dos homens matou”
...
Vário séculos depois, foi construída ali uma estrada junto do túmulo do animal. Os viajantes, fatigados das suas viagens, descansavam junto carvalho e liam a lápide. Um dia alguém sob o peso da fome, da peste e do cansaço rezou e pediu a intercepção do sepultado vitima dos homens junto das divindades para que a dor lho fosse aliviada.
...
E os milagres aconteceram. Anos depois, os habitantes construíram uma igreja bela Igreja e, lá dentro, um tumulo digno. Eis que, aquando da trasladação dos restos mortais, se deram conta que se tratava de um canídeo...

As realidades e as situações despoletam fenómenos extraordinários dentro das pessoas! Não obstante, elas mesmas, as realidades e as situações, numa conspiração vital, também no contrário são exímias...


© Mário Rodrigues - 2010

quarta-feira, 22 de setembro de 2010

Prestar atenção...

A felicidade rodeia-nos com frequência!
Descuidadamente distraídos, vamos sendo infelizes sem necessidade...

© Mário Rodrigues - 2010

segunda-feira, 6 de setembro de 2010

Afinal passaram vinte minutos...


Deveriam ser umas sete e meia da manhã e acho, que já estavam aí uns...montes de calor ainda tão cedo. Eu e meu filho, já estávamos dentro do carro, prontinhos para dar início à viagem para os penhascos. Como habitual, esperávamos que a mãe e a irmã se viessem juntar a nós para partirmos. Depois de enormes minutos lá chegam elas e debaixo dos protestos do "machedo" lá partimos.

Depois de uns bons quilómetros de auto-estrada, saímos, e entramos na estrada nacional que serpenteia por vales e montanhas pelas verdes serranias. Alguns quilómetros mais à frente vejo, na beira da estrada, uma moto mal estacionada, alguém sentado no chão de costas para a barreira da berma e mais duas pessoas de pé, num certo frenesim.
Parei, saí do carro e fui tentar aperceber-me do que se passava. Enquanto me dirigia para junto das pessoas, fui-me tentando convencer de que me agradava a ideia de o indivíduo apenas estar mal disposto pelo calor ou alguma hipotensão ou hipoglicémia, enfim, nada que viesse a exigir de mim "mexer" mais a sério na "coisa", mesmo porque já há alguns anos que nada faço na matéria e tenho noção da "ferrugem" nas capacidades e na velocidade de discernimento, a rapidez de acção e o olho astuto...já tiveram melhores dias.
Ao chegar junto das pessoas vejo o homem que estava sentado no chão, um indivíduo que aparenta uns quarenta anos, de estrutura larga e um pouco obeso, numa ortopneia bastante acentuada e pergunto o que se passa. À minha pergunta as duas pessoas dizem que também acabaram de chegar e que nada sabem do assunto. Eu coloco-me de joelhos e interpelo o indivíduo que me responde com muita dificuldade que ia a andar na sua mota quando lhe entrou uma abelha para a boca. Apercebi-me que o insecto terá sido inspirado ou ingerido visto que ele diz que a não cuspido.
Perguntei-me como tal teria acontecido e reparo para o capacete no chão, parecido com aqueles capacetes da primeira guerra mundial, de ferro com umas abas de volta. Lembro-me de que uma vez, numa situação parecida, eu ir com a camisa um pouco mais desabotoada e me ter entrado uma vespa que prontamente me ferrou na barriga junto do umbigo.
Volto a pergunta-me a mim mesmo como me fui meter naquela. Se por um lado a falta de treino e de material, no meio do nada, me levam a desejar nunca ter por ali passado e correr o risco da "coisa ficar feia", por outro lado imagino o homem ali, assentado no chão e duas pessoas de pé a observa-lo a asfixiar até à morte...

"Chamem uma ambulância rapidamente!..." - disse eu num tom quase imperativo. Sentia um misto de vergonha e de força...

Se tivesse aqui o meu antigo Golf, (carro com que trabalhava no INEM, no século passado), carregado de material até às pestanas...um nasofibroscópio... Precisava de lhe observar a cavidade bocal até lá abaixo à laringe, precisava de saber se, tal como suspeitava, ele estaria com um edema na glote...
O homem estava em franco sofrimento. A dispneia provoca-lhe a sensação de morte eminente...tenho de fazer alguma coisa...ponho-lhe uma pedra debaixo de uma das mãos e o capacete debaixo da outra para que com mais espaço de flexão para os braços e músculos abdominais ele consiga respirar alguma coisa. Com uma cana e uma lanterna de bolso consigo improvisar um laringoscópio. Obviamente não consigo confirmar se a glote inchada, devido à ferroada da abelha, lhe está a obstruir as vias aéreas. Penso no que posso fazer e vejo que não tenho nem um laringoscópio nem um tubo endotraqueal para lhe tentar meter...adrenalina ou epinefrina para lhe administrar...ainda menos!... Oh!...se pelo menos eu aqui tivesse o Dr. Helder!... Aquele homem era imparável! Aprendi muito com ele. Tinha uma mão e um treino extraordinário. Costumávamos partilhar o "olho" astuto. A esta altura já ele tinha administrado a epinefrina e já o homem ia a caminho do hospital...

Sou assaltado por um arrepio gelado no dorso!...

O homem vai-me morrer aqui nas mãos asfixiado!... Tenho uma última hipótese! Mas eu não sou médico, muito menos cirurgião, já não faço nada disto há já muito e mesmo quando fazia, nunca fiz uma traqueostomia de emergência! Não estou no bloco, quem me dera, não tenho anestesista, nem sequer um bisturi...
Pergunto se alguém tem alguma coisa gelada que me traga. Com latas de Coca-Cola e cerveja que um tinha e a água bastante fria que corria numa bica, ali perto da estrada, molhei e arrefeci uma toalha tanto quanto possível e coloquei-lhe na garganta para conseguir algum efeito vasoconstritor no sentido de diminuir o edema e reduzir a hemorragia no caso de eventualmente avançar para a loucura de abrir um acesso na traqueia. Com a ajuda dos outros, posiciono-lhe a cabeça, permitindo algum alongamento com o objectivo de facilitar a passagem de algum ar. Enquanto isso, vou-lhe contando os anéis cartilaginosos da traqueia e imaginando os dois que iria cortar para o acesso perto do esterno. Penso com o que é que lhe ia fazer a incisão. Penso se o alívio da abundante golfada de ar que iria inspirar após a abertura do acesso lhe compensaria a dor e o trauma de não estar anestesiado. Mas, ali, ou era um vivo com dores ou era um morto à espera de uma anestesia...
Nunca fiz nada disto, mas se o não fizer o gajo morre! Entre uma e outra...vai ter de ser esta a primeira vez!...Peço para me trazerem umas luvas de látex que tenho na mala do carro para quando tenho de mexer nos pneus, o frasco do álcool dos primeiros socorros, primeiros socorros...valha-me Deus...aquilo não socorre nada nem dá para fazer nada...mas enfim, o canivete suíço que o meu primo me deu e que, geralmente, costumo manter afiado e levamo-lo para um local mais fresco e mais confortável.

"Que vai fazer?" - Perguntaram-me os outros - "...está maluco? Sabe lá o que vai fazer? Mas afinal quem é você?"

Realmente reparei que nada tinha dito em relação a isso... Não quis entrar em pormenores... Quem sou eu? Sei lá eu bem quem sou eu! Só sei que tenho medo de matar um homem que morre se eu não fizer nada!... Ouço as sirenes ao longe, o homem também se apercebe do mesmo, eu digo-lhe que agora estamos melhor e que ele vai-se safar. A ambulância chega. Digo o que se passa e logo se procedeu com ventilação mecânica. Pedi um laringoscópio de emergência e com receio de já não saber fazer, coloquei o tubo endotraqueal. O homem inspira uma quantidade extraordinária de ar de uma só vez. Olha para mim, olhos nos olhos, e eu digo-lhe - "já te safaste!". Foram-se embora para o hospital...
Voltei ao carro. Sento-me exausto. Penso que, com a idade perdi muito treino, mas talvez tenha adquirido o medo para ser muito mais cauteloso e esperar pelos passos adequados. Noutros tempos, com mais treino e material, a coisa teria, certamente, sido diferente, mesmo porque havia o Dr. Helder que fazia e eu ajudava... Desta vez, sem treino e sem rede, caí no palco com um papel para o qual nunca tinha estado preparado nem já mais tinha ensaiado.

A viagem sofreu um atraso de vinte minutos. Reparo que me pareceu ter passado horas para a ambulância chegar, mas que afinal...afinal passaram vinte minutos...


© Mário Rodrigues - 2010

quinta-feira, 2 de setembro de 2010

E um dia... Um dia veio a testosterona!...


Estava eu com o pupilo de pé à beira do mar a olhar as ondas, lado a lado, numa amena cavaqueira quando...
...
"...pai, isto este ano está demais!"
"Pois está! O mar está muito mais parado que os outros anos!"
...
"Não pai!... As mulheres!... Este ano isto está cravado delas e... giras... e... boas...!"
...
"...Ahah!... Epá!... Yap!...; elas já andam aí há muito tempo!... Tu é que só as estás a ver agora!..."
...
"...Ahah!... Epá!... Yap!......"
...


© Mário Rodrigues - 2010

quarta-feira, 28 de julho de 2010

Só posso cheirar muito mal!...

Ontem, enquanto carregava uma considerável quantidade de caixas nas mãos, ia a entrar para um dos edifícios em pleno "Marquês do Pombal", no centro da cidade de Lisboa, quando o sapatinho do menino escorrega na pedra polida do degrau da entrada, e eis que, o menino dá três piruetas e dois mortais, estatelando-se no meio da bela calçada lusitana, rodeado de trinta e seis pequenas caixas de cartão.
Se é certo que efectivamente de modo algum me magoei, também é certo que o máximo que obtive dos vinte ou trinta compatriotas que assistiram ao número de circo, foi umas risadas e uns chutes numas caixas que ficaram a estorvar o esvoaçante andar de uma bela menina. Ninguém, mas rigorosamente ninguém, esboçou o menor gesto de ajuda a levantar-me ou a apanhar as ditas caixas!...
Isto só pode querer dizer uma coisa... Só posso cheirar muito mal!...

© Mário Rodrigues - 2010

sábado, 10 de julho de 2010

Nas viagens desconhecidas...


Nas viagens desconhecidas, pergunto-me como será por lá enquanto estou cá. Ansiaria eu que um abraço apertado me esperasse à chegada. Ir sem saber para onde, tem tanto de tentador como de...fio de lâmina fria em dorso hirto. A possibilidade de me ser permitido arrepender e voltar para trás poder-me-ia acalmar. Todos os dias no cais de um porto de mares conturbados, o ciclo ininterrupto da vida não pára com pessoas a chegar para ficar e outras a partir para não mais voltar. Alguns embarcam mas queriam ficar, outros queriam ir mas cá terão de estar. Alguns acabados de chegar, com medo querem se ir, são recebidos por outros a sorrir. Alguns estão só a observar, outros limitam-se a, no cais em círculos, caminhar. Há mesmo alguns que ninguém os recebe e ficam a chorar. Vejo neste cais a azáfama de chegar e partir como pontas de uma mesma viagem que muitas chegadas tende, como tantas partidas terá. A barcaça que está a chegar é a mesma que vejo já no horizonte de partida. O momento em que a prancha a liga ao cais alia as chegadas às partidas, os risos aos choros e as euforias às despedidas. Eu sou só mais um destes viajantes, sem saber o ponto em que me encontro. Quero ter acabado de chegar estando pronto para a partida...

© Mário Rodrigues - 2010

sábado, 3 de julho de 2010

O problema é que...


O problema é que tu sorris-me e eu gosto!

Realmente, barbeei-me antes do duche, perfumei-me e vesti uma roupita "janota", preparei-me e saí quando o cão me veio "cumprimentar", e sujou-me todo e deixou-me cheio de pelo e "smell"!
Realmente, encravei-me no meio do trânsito e cheguei atrasado!
Realmente, perdi o "post-it" onde escrevi o local do encontro!
Realmente, quando cheguei ao carro tinha dois pneus furados!
Realmente, está um gelo e parece que as unhas me vão cair!
Realmente, a fazer a barba cortei-me, já sujei duas camisas e ainda está a sangrar!
Realmente, não "engoli o sapo" e por um murro na mesa perdi um bom negócio!
...
O problema é que tu sorris-me e eu gosto!
Vamos ser felizes e ter um pequeno rebanho!... Eu aposto!

Realmente, está montes de gente desempregada!
Realmente, o 25 de Abril podia ter sido melhor!
Realmente, as guerras são sempre uma enorme estupidez!
Realmente, o dez de Junho e o cinco de Outubro são relativos!
Realmente, no autocarro roubaram-me a carteira, mas que hei-de eu fazer!
Realmente, desde o dia que nascemos que sabemos que vamos morrer!
Realmente, já nem ligo às calúnias, promessas e pisadelas!
...
O problema é que tu sorris-me e eu gosto!
Vamos ser felizes e ter um belo rebanho!... Eu aposto!

Realmente, armo-me em mau e faço birra, ainda que isso seja parvo!
Realmente, eu sei que hoje vens tarde, mas já estou a olhar para a porta!
Realmente, acho que aquela árvore está no lugar errado porque faz sombra à minha toalha!
Realmente, por vezes acho que tudo o que é chatice cai-me em cima!
Realmente, estas coisas podiam-me chatear, aborrecer e fazer infeliz!
Realmente, não ignoro estas coisas todas que me esbarram no nariz!
...
O problema é que tu sorris-me e eu gosto!
Vamos ser felizes e ter um enorme rebanho!... Eu aposto!


© Mário Rodrigues - 2010

segunda-feira, 28 de junho de 2010

O meu amigo Tintas... O raposo...


No outro dia, ia eu no vinte cinco, o eléctrico para os Prazeres, quando encontrei o Tintas o raposo. Já havia muito que nos não encontrávamos!...

- Então Tintas? Como estás? A Micas raposa?
- Olá Mário! Vai-se andando!
- O resto da raposada? Pergunto eu.

Enquanto nos sentávamos para que a viagem fosse um pouco mais confortável, junto a uma das janelas, passávamos ali ao "Corpo Santo", e íamos seguindo a nossa conversa...

- Olha Mário...estão bem! Eu é que tenho andado um pouco apreensivo...
- Então? Meu velho amigo canídeo!
- Eu e a minha Micas andamos um pouco "perdidos"!... Sabes os meus raposos já têm as suas idades e já seguiram à vida deles. O Mais novo arranjou uma raposita muito jeitosa e também está a organizar a vida dele... Agora ando mais a minha Micas a aprender a viver um com o outro... Os dois... Sozinhos...

Íamos passando ali pela Rua de São Paulo, na Bica, e o meu amigo Tintas fica a olhar pela janela pensativo...

- Que diabo Tintas! Estás com a Micas há tantos anos e tens de aprender a viver com ela? Agora?
- Mário! Quando me casei com a Micas, também eu saí de casa de meus pais. Agora vou-me apercebendo de que os meus pais, muitas vezes andavam à espreita de um pouco de vida, acorrendo e aturando-nos a nós e aos meus pequenos. Eles bem sabiam que eu e os meus irmãos andávamos furtivos em longas caçadas, mesmo porque essa também tinha sido a sua história. Então sempre que podiam, ou arranjavam umas lebres frescas para reunir a raposada, ou na falta de tal, chamavam os meus pequenos e os dos meus irmãos lá para a toca. Aquela balbúrdia dava-lhes cabo da cabeça, dos nervos e também de algumas carcaças de coelho, mas...também lhes devolvia uma agitação própria de grandes correrias... Por vezes, eu e a minha Micas não acedíamos com facilidade, pois sabíamos que os pequenos todos juntos são o "diabo" e que lhes davam com os focinhos nas paredes até partir. Os meus com os primos comiam este mundo e o outro, para além de chantagearem os avós com as maiores diabruras... Então fui reparando que eles, os meus pais, apesar de cansados, desejavam aquela agitação, desarrumação e balbúrdia toda, por razões especiais... Agora vejo o grande e inocente erro dos meus pais!...

A manhã estava um pouco abafada e aquele sol abrasador em "Santos" estava-me a assar os braços! Isto dantes tinha umas persianas...ia eu pensando...

- Ó Tintas! Mas que erro é que os teus pais fizeram?
- Sem qualquer noção disso, nem eu nem a Micas, depois de juntos tínhamos os nossos projectos! Certo?
- Sim! Penso que sim!
- Pois claro que sim! Uma toca em condições, umas peles para os dias frios de inverno, umas pombas e uns coelhos na dispensa, eu construía uns xilofones com os ossos das costelas dos coelhos e tinha uma banda impecável. A Micas, fazia compotas para a feira anual das melhores compotas...bem te recordas que tínhamos sempre mil coisas para fazer e, claro está, namorar...brincávamos um com o outro e fomos tendo dias felizes... Apareceram os pequenos e os dias passaram ainda a ser mais felizes. Só que, com o caminhar dos anos, os projectos da Micas e os meus foram sendo largados, com desculpas de que já não tínhamos tempo, nem paciência, nem idade e que tínhamos a raposada para olhar e criar e mais não sei o quê... Enfim... Reparei nisso, há algum tempo, antes do mais novo se "arranjar"... Ele teve fora uns dias a aprender umas novas maneiras para apanhar os "torcazes". Eu e a Micas dissemos um para o outro:
"Não temos cá o pequeno, vamos gozar umas férias catitas!..."
- Saíste-me cá um raposão!...
- Pois saí!... Fomos a uma toca de rodízio de roedores com frutas, que é um espectáculo...assim que acabamos viemos para a toca!... Começamos a ver um filme de galinhas...a meio, já estávamos fartos e chateados!...e para te ser sincero, começamos a olhar um para o outro e parece que já nem namorar sabíamos... Deixámos de saber o que fazer os dois sozinhos...esquecemos completamente como é que se vive a dois...
- Pois a raposada vai à vida e depois... Esquece-se...
- Ó Mário, mas a raposada nem nunca nos pediu, nem tem a culpa de eu e a minha Micas, termos descuidadamente transformado todos os divertimentos e ideias que tínhamos de coisas que fazíamos e outras que queríamos fazer, numa única coisa, quase obsessiva, que foi cria-los!... Vazamos as nossas cabeças de tudo o que lá tínhamos e enchemo-las exclusivamente com a ninhada e a sua criação... A ninhada depois de criada foi à vida dela e as nossas cabeças... Vácuo! Ficaram vazias! Não fizemos a gestão adequada das nossas prioridades emocionais e intelectuais... Acabámos de criar ninhada e ficámos sem nada para fazer... Pelo menos enquanto desejo e gosto. Um projecto que preencha a vida, o tempo e a vontade de amanhã ter uma serie de coisas para fazer no seguimento de um algo mais que já não seja criar a ninhada...

Já bebia um refresco. Se bem que me está a entrar aqui uma brisa vinda do Jardim da Estrela... Hum! Que fresquinho!...

- Ó Tintas, mas tu queres ser o Manuel de Oliveira...
- Não me importava, mas quero ter netos, quero brincar e divertir-me com eles, sem que eles em si sejam a minha razão de viver. Tenho de ter uma vida composta por várias causas, trabalhos e prazeres, onde a raposada esteja incluída, mas que não seja a minha bolha de ar vital. Por isso te digo, meu amigo, que realmente tenho andado um pouco apreensivo, porque me sinto quase como quando era um jovem raposito e andava aflito a tentar achar uma coisa para ser quando fosse grande...

Cá estamos. Campo de Ourique!... Tenho belas recordações deste bairro desde os tempos da tropa...

- Tintas! Queres beber uma limonada bem fresquinha debaixo daquelas sombras ali do jardim?
- Vamos a ela, caríssimo!...
...
...E sabes uma coisa? A minha Micas, já não é aquela raposa formosa que me flamejava os olhos com o seu passar, tal como eu também não, diga-se em abono da verdade... Mas...aqueles olhos e o seu focinho húmido ainda me deixam... à procura de "lebre"...


© Mário Rodrigues - 2010

quarta-feira, 23 de junho de 2010

Empalados em arenas.


...Segui pelo corredor até ao fim. O corredor era bastante largo e longo. No chão uma alcatifa vermelha, as paredes forradas a nogueira eram relativamente baixas. Ao longo do corredor, junto das paredes estavam figuras de dezenas de pessoas. Todas eram conhecidas. Cantores, pintores, escritores, cientistas, filósofos, etc... Como se fosse estatuas de cera... No final do corredor depois de descer dois suaves degraus encontro duas enormes portas de madeira muito clara parecia abeto ou faia...

Quando empurrei as portas vejo uma espécie de arena toda forrada de veludos e acolchoados, conferindo um ambiente de absoluto e luxuoso conforto.
Por todo o lado existiam varas de madeira com pontas afiadas espetadas no chão com os bicos para cima... Em todas elas estavam pessoas empaladas que sorriam e conversavam alegremente entre elas. Alguns discutiam negócios, taxas de juro, a beleza de senhoras ali ao lado... Tudo completamente indiferente ao insignificante facto de estarem todos empalados...
Reparei que todas as varas tinham uma inscrição, "sapere - tenere - potere"!

Havia oradores, que também empalados, diziam palavras extraordinárias de ordem, de incentivo, de glória, honra e até mesmo esperança... No entanto ninguém lhes parecia dar grande atenção com excepção dos que aguardavam que eles terminassem para eles próprios começarem as orações deles...

Bastante assustado ia passando entre eles observando aquele espectáculo dantesco. De dentro do ventre de uma mulher um feto coloca a cabeça para fora gritando muito zangado e indignado!... Morde-me voraz. Da ferida causada pelas dentadas no meu braço escorreu... Incompreensão, admiração e um pouco de escárnio...

Reparo também que ali andam alguns animais, também eles um pouco assustados. No entanto não estão empalados. Têm um comportamento normal com excepção do facto de morrerem muitos e sem razão aparente. Passado algum tempo de eu por ali andar ouço uma voz nos altifalantes que dia:

"Informamos o senhor, que terá de escolher o local onde pretende fixar a sua existência. Não poderá manter-se mais tempo a por em risco a ordem."

Estranho, vejo que já todos me olhavam identificando-me como sendo o "senhor" de que se falava no altifalante!

Reparo então, que eu próprio me encontrava trespassado por uma daquelas lanças...


© Mário Rodrigues - 2010

quarta-feira, 16 de junho de 2010

A Mulher...


"O que seria do mundo sem a mulher. Dai às paixões todo o ardor que puderes, aos prazeres mil vezes intensidade, aos sentidos a máxima energia e convertereis o mundo em paraíso, mas tirai dele a mulher, e o mundo será um ermo melancólico, os deleites serão apenas prelúdio do tédio."


Autor: Alexandre Herculano (1908)

terça-feira, 8 de junho de 2010

Mas quem escolhe a vaselina sou eu!...


Há algum tempo vivi uma situação que descrevi em "Eu não sou doutor!...", que me deixou "podre de raiva". Se naquela situação entendi a posição do interveniente, na que se passou hoje não entendo. Um dia destes, depois de a raiva me passar, talvez a descreva já devidamente lixiviada pelo tempo. Agora não. A vida tem feito de mim um homem de causas. A indignação, o inconformismo, a raiva e a vergonha, muitas vezes me têm empurrado para a defesa de posições que me custam etiquetas, cicatrizes e outras coisas...
Mais uma vez voltei a perceber que a maioria das pessoas tem tendência a "arruaçar" sem razão e a acobardar na frente do decisor quando a razão é exclusivamente delas. As pessoas "vendem-se" demasiadamente barato. Um indivíduo pseudo-bem vestido, que vomita uma série de incongruências, previamente seleccionadas para embaraçarem os outros, cala uma multidão que minutos antes na rua tinha jurado que o esfolava vivo; ao qual eu respondia que era preciso dialogar com a pessoa certa e do modo correcto...
Cinco, cinco minutos bastaram para que aquele energúmeno, que desde já declaro como sendo um óptimo cão de fila, tenha conseguido que trinta e duas pessoas ficassem a olhar para mim, com ar raivoso, por eu estar a confrontar, com convicção, o indivíduo com as suas incoerências assumindo uma posição de intransigência com relação às suas pretensões.

"...Então! Se o Sr. Dr. diz! Vamos arriscar!..."

"Escutem lá uma coisa meus amigos! O coiro que eu estou aqui a defender, nem sequer é o meu!..."

Entre amigos, eu costumo dizer:
"Se tiver de ser, desde que me digam, até me podem vir ao cu! Mas quem escolhe a vaselina sou eu!..."

Sim! Estou ligeiramente azedo...

© Mário Rodrigues - 2010

segunda-feira, 10 de maio de 2010

- Nada! Não é nada!...


Hoje, pela manhã vejo alguém, a quem com um olhar pergunto:

- Então como estás?

Esse alguém me responde:

- Por aqui vou estando! Acordei antes do toque do relógio. Esperei um pouco e levantei-me, apesar de ainda cedo e de nada ter para fazer... Saí porque...porque se tivesse algo para fazer, sairia àquela hora. Não corro porque não tenho para onde... Simulo algum trabalho e...regresso já depois de serem reduzidas as hipóteses de perguntas. Perguntas que nunca sei responder de outro modo que não seja...um trejeito de boca acompanhado do respectivo encolher de ombros...o que em simultâneo faz com que sinta um moderado enrugamento do estômago acompanhado de pressão sobre o externo...

Com alguma preocupação pergunto:

- Mas então o que tens tu? Que se passa?

Esse alguém me responde:

- Nada! Não é nada!

Insistindo pergunto:

- Nada? Mas que tens? Que se passa?

Esse alguém me responde:

- Tenho quase tudo o que preciso! Incluindo coisas que não preciso! Há coisas que ainda não tenho, mas tenho tempo, para as ter! Há coisas que sempre ansiei, mas temo que já mais algum dia as tenha! Mas...acima de tudo lamento! Lamento muito as durezas dos corações! Corações que outrora moldados por mãos frias em pedra dura, amputados de quente ternura, não saibam pedir perdão! Que tantas vezes, nem tal careciam! Houvesse simplesmente um pegar de mão na mão... Mas ternura sei eu que têm! Apenas penas tenho, que tal amor e doçura, de paredes grossas seja refém! O que custa a muita gente, não é verdadeiramente o gesto de estender a mão! Fosse ele certamente, para em vez de pedir...conceder o perdão...


© Mário Rodrigues - 2010

terça-feira, 4 de maio de 2010

Como atropelar uma ratazana que saiu de uma sarjeta a correr.

O acto de atropelar é na realidade uma acção constrangedora!

Tenho desde já a afirmar e antes de mais, que o atropelamento terá de ser acidental. De contrário trata-se de um assassinato e os assassinatos são sempre condenáveis pelo que se assim for recusar-me-ei a fazer a síntese de tal acto e isto acaba já aqui!


© Mário Rodrigues - 2010

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Uma coisa é uma coisa...


Uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa!

Reflicto sobre a possibilidade de uma coisa ser outra coisa, assim como outra ser uma coisa.
Numa primeira abordagem à ideia surge-me a impossibilidade te tal. A menos que a coisa seja desprovida de coerência, identidade e orgulho, a troca pela outra ou a fusão em uníssono, dando origem à outra coisa, é totalmente impossível! Tal faria surgir uma terceira que teria a agravante de não ser nem uma nem outra, coisa, claro!
Isso não está previsto nesta reflexão.
Não obstante reconheço a possibilidade de uma coisa, apesar de não ser outra, poder através de processos complexos e insuspeitos, tais como uma acção proveniente do exercício de um acto, se transformar em outra coisa!
No entanto, este primordial processo de criação carece de um desconhecimento inicial da outra coisa, a fim de prevenir a existência do dito terceiro.

Mas agora reparo que tal acção indicia pouca honestidade da minha parte...

Extraordinário!...Perante a necessidade de ultrapassar um obstáculo, não hesitei, coagi-me a manipular a realidade, ferindo de morte e desrespeitosamente aniquilando a outra coisa, transformando-a na coisa, com o propósito convicto de atingir o meu objectivo!...

Serei eu de confiança?... Hum!... Francamente!...

Se a honra, a honestidade, o respeito e os meus princípios tivessem peso suficiente no meu carácter, atrasaria o relógio o tempo suficiente para que de novo pudesse proceder à reflexão de um modo eticamente correcto e honesto!
Mas, não posso deixar de reparar que isso não basta. Apesar de ter regredido no tempo, não anulei o processo de reflexão anterior! Assim terei de lidar com uma reflexão contaminada pelas conclusões da que a antecedeu...
Isso muda completamente o desenrolar espontâneo e aleatório do processo, visto que, poderei não resistir, à tentação hipócrita, de tentar parecer muito correcto nos meus actos e reflexões devido à consciência da conotação que me adveio da anterior experiência!...
Pois bem! Serei desmascarado!...
Reparem, tal como a espontaneidade, a aleatoriedade não existe. Rapidamente todos constatarão que uma coisa é uma coisa, outra coisa é outra coisa!


© Mário Rodrigues - 2010

segunda-feira, 26 de abril de 2010

Tela branca, alva, calva...


Tela...
Tela branca, alva, calva...
Apesar de habitualmente não pintar, tive urgência em fazê-lo! Numa corrida furtiva, fui a uma loja e comprei uma tela branca, três pastéis pretos, duas bisnagas de acrílico vermelho...umas espátulas e carvão...

Em casa, isto é, num local de improviso montei o cavalete e agarrei a tela. Olhei demoradamente para o vazio da tela até ela ficar completamente branca...mas não consegui...ao fechar os olhos consegui vê-la finalmente vazia e branca!

Demorei-me um pouco, pelo receio de que a alvura de novo fugisse. Já está. Agora é que vou conseguir desenhar...

A fraqueza!...

Os momentos que tenho privado com ela, fazem-me sentir-lhe as formas. Formas esguias, ovais de coragem esbatida e medo berrante... Formas sem margens, de definições muito marcadas que quase rasgariam a tela, vermelhos incolores de vergonha...ou antes timidez... Não, são mesmo é de medo!

Tiro a tela do cavalete e ponho-a em cima de uma mesa. Vai-me dar muito mais jeito...
Com o pastel e o carvão traço marcas de vida, com rombos, curvas e vértices redondos como espinhos de roseira. Depois com a mão esfrego até atingir grandes zonas de sombra. Biombos de cobardia!...

Agora com o acrílico vermelho, vou traçar-lhe grandes áreas de ousadia!... Isso mesmo, ousadia e uns bouquets de coragem!...

Coloco uma boa porção da pasta na tela...mas aqui não me dá jeito!

Ponho-a no chão. Com uma espátula em cada mão atiro-me na disposição de a mutilar avidamente. Os biombos e os cenários de sombras haveriam de sofrer a brutalidade da coragem e da força. Calculo-lhes as formas das mandíbulas e em movimentos precisos e calculados começo a dar-lhes formas...

A luta é renhida, as sombras estendem-se com pouco esforço abafando o escarlate. As espátulas ficam moles como tiras de papel pardo!...aquilo não me agrada nada, sinto-me muito pouco potente, não obstante da minha valentia, luto contra aqueles riscos de carvão que a minha mão já tinha esbatido, mas que me exibem os caninos exuberantes!...

Num acto quase descontrolado salto com os dois pés juntos para cima da tela...
Então afundo-me... Enquanto me afundo olho para a superfície e vejo, em imagens pouco focadas, os pasteis e o carvão, nas suas enormes casacas de golas peludas rindo!... Rindo em gargalhadas de desdém que mostram os seus pútridos dentes negros em bocas de dominação!...

© Mário Rodrigues - 2010

quinta-feira, 1 de abril de 2010

Eram outros tempos... III


Escrevia Joaquim Teófilo Fernandes Braga, algures no ano 1865 na sua obra "As Teocracias Literárias - Relance sobre o Estado Actual da Literatura Portuguesa".

"Estamos numa terra em que a verdade para ser ouvida precisa trazer a forma de escândalo. A não vir deste modo é uma coisa ininteligível, obscura.
Tanto melhor para quem aspira a ser entendido somente por aqueles que se pagam de sua obscuridade pela firmeza da consciência, e integridade de carácter."

Ainda bem que isto foi em 1865...

© Mário Rodrigues - 2010

terça-feira, 23 de março de 2010

Se eu fosse "soláquio"


Se por cada milhão de segundos na face da terra, no sol são menos 2,12 segundos, se em vez de terráqueo eu fosse "soláquio", seria muito mais novo...
Teria menos 44,56 minutos de idade!...

© Mário Rodrigues - 2010

terça-feira, 16 de março de 2010

O presente

O presente...é um acaso da liberdade. Portanto...não existe!

© Mário Rodrigues - 2010

Mensagens populares