sábado, 23 de maio de 2009

Talvez - Primeira parte, bocado nº 1

...já viste as horas? Como sempre isto parece os casamentos, marca-se para as dez, esperando que ao meio-dia, todos lá estejam.
- Oh! Amigo Leopoldo; estás com pressa de quê? Acalma-te rapaz!
A sala ainda estava fria, o João acendera a lata da serradura à pouco mais de vinte minutos. O tubo que tinha sobrado do esquentador da avó do Leopoldo, e que agora servia de chaminé para o “aquecimento central”, estava de tal modo que parecia um passador de chá; a quantidade de fumo que estava na sala era bastante generosa, no entanto o elevado “pé direito” da sala permitia que ele formasse uma nébula lá no alto, e pouco incomodo provocasse aos dois amigos.
A noite estava fria, o relógio de caixa de madeira com uma porta que tinha dois vidros, um no mostrador e o outro mostrava o movimento do pêndulo, que estava na parede bordeaux escurecida pelos fumos do “sistema de aquecimento”, marcava vinte e duas horas e quarenta e sete minutos. Havia já alguns meses que algumas, geralmente, sextas-feiras à noite alguns amigos... eventualmente algo mais que conhecidos, se encontravam naquele lugar. Uma sala com três dúzias de metros quadrados, que geralmente estava pouco aberta, apesar das suas cinco janelas bastante altas, uma em cada parede. O João fazia questão de não mudar muitas coisas naquela sala. A casa já tinha uns bons anos. Sempre se lembra de lá viver com a sua avó. Oh! ... Sábia Senhora. As árvores em redor, foram-lhe proporcionando um misto de sombra fresca e de amarelos outonais das folhas esvoaçando pelo caminho, imprescindíveis para poder manter o seu estado de nostalgia em que gostava de viver, apesar de quando em vez ter de despertar os sentidos de alguma maneira sob pena de se embrenhar demasiado nos longos braços do seu estado letárgico ficando impedido de voltar a ser o que geralmente não gostava muito de ser.
Sobre o soalho de carvalho, distribuíam-se aleatoriamente alguns tapetes, duas cadeiras de madeira que não eram estufadas mas que eram giratórias, quatro sofás cobertos com mantas de trapos, uma mesa de nogueira bastante baixa mas grande e ampla dois ou três bancos altos como aqueles em que o Rui Veloso e o Sardet costumam tocar enquanto cantam. Dos doze apliques de vidrinhos, oito tinham as lâmpadas fundidas. O computador que tinha comprado em segunda mão e que só servia para aquilo, proporcionava horas intermináveis de música ininterrupta com a qual, João voava nos céus das esperanças, rastejava nas lamas da tristeza despropositada ou se afundava mesmo nas profundezas da nostalgia melancólica, desafiando-se a si mesmo num exercício de renascimento, quando se torna-se já perigosa a permanência.
As quatro lâmpadas de vinte e cinco watts deixavam escorrer pelas paredes uma claridade indirecta algo aconchegante e muito discreta.
Naquela noite de Janeiro o Leopoldo foi o primeiro a chegar veio directamente da escola. O Leopoldo, um jovem de vinte e sete anos, trabalha num hiper-mercado como repositor durante todas as horas que pode, após as quais, corre para a escola para acabar o secundário em pós-laboarl. É o único filho do casal numa família bastante modesta e de poucos recursos financeiros... (AVISO: é possivel que continue)

© Mário Rodrigues - 2009

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…Escrevo, principalmente, por falta de espaço dentro de mim para tantas emoções e tão grandes, para mim. Nos comentários, fico com a sensação de que os pingos de emoção que transbordo, caiem em "terras fecundas" e coadjuvam o nascimento de novas emoções, produzem opiniões, contra pontos e desafios… E isso, isso é “geleia real”, para as nossas vidas…

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