quinta-feira, 21 de maio de 2015

Nepal e o resto do cosmos

Muito amo vida e família que dada me foi. Tanto a ambicionava compatível e "imprescindida", com o estar lá, onde o sofrimento escorre nas valetas para as ribeiras formando grandes rios de raivosa dor. Lá não há desemprego porque as 24 horas são vergonhosamente escassas para o trabalho que sentimos obrigação de ter feito. Por lá não choro, por as lágrimas já ter secado e nada me escorrer no rosto sujo para além de suor. Por lá, as coisas não são mesquinhas porque não há coisas. Por lá... Por lá há espaço suficiente ao lado de moribundo para que com a nossa mão afaguemos rostos ensanguentados até a alquimia da vida abandone a amalgama de carbono que antes fora homem...

Por lá... Há "farrapos" que com os nossos cuidados, raivas, ansiedades, duvidas, fome, sede, saudades e dores, readquirem a alquimia da vida e a nosso lado se transformam em polvos com braços muito numerosos e enormes através dos quais, afagamos muitos mais rostos e beijamos muitas mais testas empoeiradas mas que ali e naquele momento amamos de uma maneira derradeira...

Gostaria que um dia, eventualmente póstumo, pelo menos um, com um olhar me demonstrassem que perceberam e também querem este sofrimento. Só com ele eu sinto a minha incomensurável felicidade e sorte de vos ter e compreender que tal como "por lá", "por cá" também podemos nos embrenhar neste sofrimento feliz que é amar uma vida incógnita.

© Mário Rodrigues - 2015

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